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Cinemateca Capitólio Realiza Ações de Programação Virtual
19 de junho de 2020

 

Embora as atividades presenciais da Cinemateca Capitólio estejam temporariamente suspensas devido à pandemia do coronavírus desde 14 de março último, a instituição vem mantendo diferentes ações de programação virtual, através da disponibilização de conteúdos relacionados ao cinema em suas redes sociais. Além do compartilhamento diário de links de filmes iniciado em 19 de março, são publicadas em dias intercalados duas seções informativas, “Histórias do Cinema Gaúcho” e “Cartazes do Cinema Gaúcho”, que juntas somam até o momento 30 postagens.

A série de postagens “Histórias do Cinema Gaúcho” já resgatou, entre outros, a trajetória de pioneiros do cinema local como Eduardo Hirtz e Eduardo Abelim, de atores como Mary Terezinha (até hoje a recordista em participações em longas produzidos no Rio Grande do Sul, tendo atuado em 12 filmes ao lado de Teixeirinha) e Breno Mello (jogador de futebol porto-alegrense que conheceu o sucesso internacional ao protagonizar o filme francês Orfeu do Carnaval, vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes e do Oscar de melhor filme estrangeiro), do célebre cartazista Benício, do Festival de Cinema de Gramado ou de salas de cinema como o Bristol, o Ponto de Cinema e o Recreio Ideal (primeiro cinema fixo de Porto Alegre, inaugurado em 1908).

Já a seção “Cartazes do Cinema Gaúcho” procura valorizar o papel dessas importantes peças gráficas de divulgação, várias delas depositadas no Centro de Documentação e Memória da Cinemateca Capitólio, destacando o trabalho de artistas e designers muitas vezes anônimos e que ajudam a contar a história do cinema produzido no Rio Grande do Sul em diferentes épocas.

O compartilhamento de links de filmes iniciado em março já indicou mais de 60 títulos. Essa ação de curadoria virtual também é realizada pela equipe do Programa de Alfabetização Audiovisual da Cinemateca Capitólio, que disponibiliza em sua página filmes dirigidos ao público infanto-juvenil.

A resposta positiva a tais ações pode ser comprovada pelo grande número de acessos, comentários e compartilhamentos nos perfis da Cinemateca Capitólio no Facebook, no Instagram e no Twitter, o que mostra que mesmo em tempos de confinamento a instituição vem conseguindo manter o contato com o seu público.

 


HISTÓRIAS E CARTAZES DO CINEMA GAÚCHO

Recreio Ideal, o primeiro cinema de Porto Alegre

Embora as exibições cinematográficas itinerantes tenham se tornado uma opção de lazer habitual no Rio Grande do Sul a partir de 1897 (dois anos após a sessão inaugural do cinematógrafo pelos irmãos Lumière em Paris, em dezembro de 1895), só bem mais tarde Porto Alegre ganharia a sua primeira sala de cinema fixa.

Em anúncio publicado no jornal “Correio do Povo”, em sua edição de 20 de maio de 1908, foi divulgada a inauguração do cinema Recreio Ideal, no antigo número 321 da Rua dos Andradas, em frente à Praça da Alfândega. O Recreio Ideal pertencia à empresa José Tous & Cia. e entraria para a história ainda por ser o cinema onde foi exibido o primeiro filme de ficção gaúcho, “Ranchinho do Sertão”, de Eduardo Hirtz, em 1909.

Em maio de 1909, o Recreio Ideal mudou para os números 311-313 da Rua dos Andradas, com instalações mais amplas, e ali ficou até ser destruído para a construção do Edifício Imperial, juntamente com outras edificações vizinhas. O terreno que o Recreio Ideal ocupava corresponde ao canto direito do atual prédio do antigo cinema Imperial, colado ao prédio do Banco Safra. O Ideal fechou suas portas definitivamente em outubro de 1916.

Aos interessados em conhecer mais sobre os primórdios da exibição cinematográfica em Porto Alegre, recomendamos o livro “Entre Lanternas Mágicas e Cinematógrafos: As Origens do Espetáculo Cinematográfico em Porto Alegre 1861-1908”, da historiadora Alice Trusz, lançado em 2010, disponível na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

Cartaz: “Um Homem Tem de Ser Morto”

(1973, ficção, 85 minutos), de David Quintans. Com Geraldo del Rey, Susana Bernhardt, Ricardo Hoeper e Pedro Machado.

Sinopse: Hasting, o homem de confiança de Simon, presidente da Organização, candidata-se às eleições por sentir que o regime não tem condições de sobrevivência. Sem apoio do povo, Simon se elege fraudulentamente. Hasting, perseguido, é obrigado a exilar-se. Do exílio, através de várias tentativas armadas, tenta recuperar a posição que ganhou legitimamente. Tudo fracassa em virtude da infiltração de homens de Simon em suas fileiras. Alguns anos mais tarde, Hasting é atraído à fronteira de seu país por Kramer, pois, segundo este, existem armas e homens suficientes para derrubar Simon. Hasting aceita o plano, mas, no local combinado, descobre que se trata de uma cilada para eliminá-lo. Depois de uma perseguição de automóvel, Hasting é assassinado e enterrado perto de um rio, juntamente com sua secretária.

Drama político que dialoga com o cinema policial, foi o primeiro longa-metragem gaúcho a participar da mostra competitiva do Festival de Gramado, em sua segunda edição, realizada em janeiro de 1974.

Autor do cartaz: João Mottini
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

 

 

 

 

 

Jacob Koutzii, pioneiro da crítica cinematográfica

Jacob Koutzii (1908-1975) foi o primeiro crítico de cinema a escrever regularmente sobre filmes na imprensa porto-alegrense, usando o pseudônimo de Plínio Moraes. Publicada a partir de 1936 em jornais como o “Diário de Notícias”, “Folha da Tarde”, “Jornal da Noite” e “Correio do Povo”, a crônica cinematográfica de Plínio Moraes marcou época e revelou um analista arguto, que se dedicou a refletir sobre o cinema com lucidez, engajamento e paixão.

Nascido na Rússia, Koutzii chegou ao Brasil ainda criança, na companhia dos pais Joil e Olga Koutzii. Autodidata, foi o interesse pelo cinema que o levou ao jornalismo, embora a sua principal atividade profissional tenha sido sempre o comércio. Um dos sócios-fundadores do Clube de Cinema de Porto Alegre, Koutzii escreveu no calor da hora sobre obras-primas seminais, entre elas o hoje clássico “Cidadão Kane”, de Orson Welles, definido por ele como “um filme-marco, um ponto de partida para uma nova fase na cinematografia”.

Em 1997, a Coordenação de Cinema, Vídeo e Fotografia da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre publicou o livro “A Tela Branca – A Crítica de Plínio Moraes”, compilação de textos de Koutzii, dentro da coleção Escritos de Cinema. O livro está disponível na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

 

Cartaz: “Coração de Luto”

(1967, ficção, 105 minutos), de Eduardo Llorente. Com Teixeirinha, Mary Terezinha, Miro Soares e Amélia Bittencourt.

Sinopse: Um velho fazendeiro rico decide casar-se novamente, tendo um filho. Mas os três filhos mais velhos de seu primeiro casamento são ambiciosos e cruéis, e quando o pai morre, expulsam o caçula e sua mãe. Quando mais uma tragédia recai sobre a família, o pequeno Vitor se vê sozinho no mundo.

Filme que lançou a exitosa carreira cinematográfica do cantor e compositor Teixeirinha, é uma das produções de maior público da história do cinema gaúcho.

Autor do cartaz: Thierry
Técnica: Desenho e Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

 

O Primeiro Festival de Cinema de Gramado

A primeira edição do Festival de Cinema de Gramado, que em 2020 completa 48 anos de existência, aconteceu em janeiro de 1973.

 


Na ocasião, o correspondente da revista “Filme Cultura”, em seu número 23, assim se referiu ao evento: “A pequena cidade de Gramado, Rio Grande do Sul, distante uma hora e meia, de carro, de Porto Alegre e internacionalmente conhecida como “a cidade das Hortênsias”, marcou um tento com o seu I Festival de Cinema Brasileiro, ocorrido entre 10 e 14 de janeiro último. Cinco filmes concorreram aos prêmios oferecidos pelo INC e ao troféu Kikito (símbolo do artesanato local): “A Casa Assassinada”, “Cassy Jones – O Magnífico Sedutor”, “Janaína, a Virgem Proibida”, “Roleta Russa” e “Toda Nudez Será Castigada”.

O júri dessa primeira edição contou com a participação de Paulo Emílio Sales Gomes, Lilian Lemmertz, Irene Stefânia, Alcino Teixeira de Mello, Clóvis Mezzomo, P. F. Gastal, Antônio Jesus Pfeil e Alex Viany. Foram premiados os seguintes filmes:

Melhor Filme: “Toda Nudez Será Castigada”, de Arnaldo Jabor

Melhor Ator: Carlos Kroeber, por “A Casa Assassinada”, de Paulo César Saraceni

Melhor Atriz: Darlene Glória, por “Toda Nudez Será Castigada”

Melhor Diretor: Luiz Sérgio Person, por “Cassy Jones – O Magnífico Sedutor”

Prêmios Especiais: Antônio Carlos Jobim pela música de “A Casa Assassinada”, e André Faria pela fotografia de “Roleta Russa”, de Bráulio Pedroso

Menção Especial: “Toda Nudez Será Castigada”, pela utilização da música de Astor Piazzolla

Menção Honrosa: “O Homem do Corpo Fechado”, de Schubert Magalhães, e “Piconzé”, de Yppe Nakashima (exibidos fora de concurso)

* A coleção completa da revista “Filme Cultura” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

Cartaz: “Ilha das Flores”

(1989, ficção/documentário, 12 minutos), de Jorge Furtado. Com Ciça Reckziegel e Paulo José (narração).

Sinopse: Um tomate é plantado, colhido, transportado e vendido num supermercado, mas apodrece e acaba no lixo. O filme segue-o até seu verdadeiro final e então fica clara a diferença que existe entre tomates, porcos e seres humanos.

Curta-metragem que é um marco do cinema gaúcho, desde a sua estreia no Festival de Gramado de 1989. No ano seguinte, foi premiado no Festival de Berlim, consagrando internacionalmente o nome do diretor Jorge Furtado. Eleito pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema como o melhor curta da história do cinema brasileiro.

Autor do cartaz: Jorge Furtado
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

 

 

 

 

 

Cartaz: “Um é Pouco, Dois é Bom”

(1970, ficção, 97 minutos), de Odilon Lopez. Com Aracy Esteves, Carlos Carvalho, Odilon Lopez e Francisco Silva.

Sinopse: Episódio “Com Um Pouquinho de Sorte”: Jorge, motorista de ônibus, e Maria, comerciária, se casam e vão residir num apartamento popular. Ela, grávida, é despedida do emprego e ele, sofrendo um acidente, tem o mesmo destino. O casal começa a sofrer com problemas financeiros. Episódio “Vida Nova Por Acaso”: Magrão e Crioulo vivem às custas de roubos de bolsas femininas nas ruas centrais de Porto Alegre, embora nem sempre sejam bem-sucedidos em seus golpes.

Um dos tesouros escondidos do cinema brasileiro, este longa em dois episódios foi dirigido por Odilon Lopez no início da década de 1970. Trata-se de uma deliciosa comédia urbana, que conta com a colaboração do escritor Luís Fernando Veríssimo no roteiro. Primeiro longa-metragem assinado por um realizador negro no Rio Grande do Sul.

Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

 

 

 

 

 

Eduardo Hirtz, pioneiro do cinema

Um dos empresários pioneiros da exibição cinematográfica em Porto Alegre, o alemão Eduardo Hirtz (1878-1951) também gravou seu nome na história do cinema gaúcho por ter dirigido aquele que é considerado o primeiro filme de ficção produzido no Rio Grande do Sul, “Ranchinho do Sertão”, lançado no dia 3 de março de 1909 no cinema Recreio Ideal.

Hirtz chegou ao Brasil com apenas três anos de idade, em novembro de 1881. Após alguns anos vivendo no município de Estrela, mais tarde se transfere com a família para Porto Alegre, onde desenvolverá sua carreira empresarial no ramo cinematográfico.

Tendo como sócio o irmão Francisco, em 1897 criou a empresa Hirtz & Irmão, dedicada à impressão gráfica. Empolgado com o advento do cinema, começa a investir na produção, mantendo “um laboratório completo, com tanques de revelação, secador, copiadora, duas câmeras Pathé e uma Debret” (segundo artigo do pesquisador Antônio Jesus Pfeil publicado na edição de número 25 da revista “Filme Cultura”, em março de 1974).

Hirtz se dedicou com afinco à produção de documentários e cinejornais, como relata o pesquisador Glênio Póvoas, professor da PUCRS: “Eduardo Hirtz produziu filmes curtos (provavelmente não deveriam passar de 10 minutos de projeção) entre 1909 e 1912, exatamente no período que a historiografia clássica cunhou de Bela Época do Cinema Brasileiro – em que o produtor detinha o controle do sistema de circulação do filme: produção-distribuição-exibição. Eduardo Hirtz possuía circuito de salas em Porto Alegre e no interior do Rio Grande do Sul.

No segundo semestre de 1912 produz o cinejornal “Recreio Ideal-Jornal”, com Emilio Guimarães como cinegrafista, tratando-se no Rio Grande do Sul da primeira investida sistemática nesta categoria. São produzidas 21 edições com estreia às sextas-feiras entre julho e dezembro; cumprindo exibições no interior, como em Rio Grande. Pelos conteúdos publicados na imprensa, o “Recreio Ideal-Jornal” registra a intensa atividade da cidade: matchs, corridas no prado, a Rua da Praia, festas religiosas, o Tiro Brasileiro, revista e desfile da Brigada e diversas festas. O período coincide com uma recessão no cinema brasileiro.”

Eduardo Hirtz dá nome a uma das salas de cinema da Casa de Cultura Mário Quintana, em homenagem ao legado desse pioneiro.

* A coleção completa da revista “Filme Cultura” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

 

Cartaz: “Aqueles Dois”

(1985, ficção, 75 minutos), de Sérgio Amon. Com Pedro Wayne, Beto Ruas, Suzana Saldanha, Oscar Simch e Maria Inês Falcão.

Sinopse: Dois funcionários públicos, de temperamentos distintos, mas igualmente solitários, tornam-se amigos. A intensificação gradativa da ligação provoca relações de envolvimento, cumplicidade e identificação obstaculizadas pelos preconceitos dos demais.

Adaptação do conto homônimo de Caio Fernando Abreu (1948-1996), publicado no livro “Morangos Mofados”. O filme contou com a colaboração de Caio no roteiro e foi fotografado por César Charlone, que mais tarde assinaria a fotografia de “Cidade de Deus” (2000), de Fernando Meirelles e estrearia na direção com “O Banheiro do Papa” (2007).

Autor do cartaz: Fiapo Barth e Rochelle Costi
Técnica: Fotografia e Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

 

 

 

 

 

Cinema Bristol, um marco da cinefilia porto-alegrense

Em 1970, o gigantesco Cinema Baltimore, localizado na Avenida Osvaldo Aranha, inaugurou um novo anexo, o Cinema Mini Baltimore, ocupando o espaço do antigo salão de festas do cinema, no segundo andar. Em maio de 1975, a pequena sala muda de nome, passando a chamar-se Cinema Bristol, e começa a investir numa “programação de arte”, com retrospectivas temáticas e exibição de filmes clássicos, assinada por críticos como Tuio Becker e Hiron Goidanich e, sobretudo, Romeu Grimaldi, um nome referencial da cinefilia porto-alegrense.

Muito antes da facilidade de acesso do home video e, posteriormente, do compartilhamento virtual de filmes, era no Bristol que os cinéfilos locais tinham acesso às filmografias de diretores como Fellini, Bergman, Truffaut, Godard, Pasolini, Buñuel, Kurosawa, Rossellini, Visconti, Glauber e tantos outros.

Para Tuio Becker, o Bristol foi “a cinemateca dos pobres”, numa comparação com a mítica Cinemateca Francesa. Assim sendo, podemos afirmar sem medo que Grimaldi, em seus anos como programador do Bristol, foi o nosso Henri Langlois.

Quando fechou suas portas definitivamente, no ano 2000, o Bristol já se chamava Baltimore 3 e em nada lembrava os tempos de glória, marcados por seus “ciclos” inesquecíveis, pelas filas imensas e por suas disputadas sessões da meia-noite, quase sempre com ingressos esgotados.

 

 

 

 

 

Cartaz:“Domingo de Grenal”

(1979, ficção, 96 minutos), de Pereira Dias. Com Paulo Santana, Chibé, Roberto Gigante e Vânia Elizabeth.

Sinopse: Hugo e sua família vivem e sofrem para o time do Grêmio. Na casa vizinha, a família de Juca é torcedora fanática do Internacional. As provocações são constantes. Durante a semana em que os dois, Grêmio e Inter, disputam a decisão do campeonato, as duas famílias descobrem o romance entre o filho de Juca e a filha de Hugo, até então acobertado pelo padre do bairro.

Adaptação bem humorada do clássico “Romeu & Julieta”, de William Shakespeare, que transfere o dilema dos jovens amantes de Verona para a Porto Alegre do final dos anos 1970. Aqui, o jovem casal é impedido de consumar sua paixão devido à rivalidade futebolística de suas famílias, já que uma torce pelo Grêmio e outra pelo Internacional.

Autor do cartaz: Ronaldo
Técnica: Desenho
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

 

 

 

 

 

Benício, o grande cartazista do cinema brasileiro

Natural de Rio Pardo, onde nasceu em 14 de dezembro de 1936, o gaúcho Luiz Benício da Fonseca adotou o nome artístico de Benício, tornando-se conhecido como um dos mais importantes desenhistas e ilustradores do país.

Benício iniciou sua trajetória como desenhista ainda muito jovem, em Porto Alegre, e em 1953 transferiu-se para o Rio de Janeiro. Ao longo de mais de 50 anos de trabalho, o artista criou milhares de capas de livros, cartazes de
filmes, capas de discos, anúncios publicitários e ilustrações de livros.

O auge da carreira de Benício ocorreu na década de 1970. Foi nesse período que o artista passou a ser o mais disputado ilustrador de cartazes do cinema nacional, produzindo cerca de 300 peças em duas décadas de
intensa atividade. Benício assinou cartazes de títulos icônicos como “Toda Nudez Será Castigada” e “Dona Flor e seus Dois Maridos”, sendo também muito requisitado pelos produtores da pornochanchada, retratando as situações maliciosas e as formas voluptuosas das atrizes daqueles filmes com seu estilo inconfundível.

Benício criou ainda todos os cartazes dos filmes do grupo Os Trapalhões.

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “Anahy de las Misiones”

(1997, ficção, 110 minutos), de Sérgio Silva. Com Aracy Esteves, Marcos Palmeira, Dira Paes, Matheus Nachtergaele, Paulo José e Fernando Alves Pinto.

Sinopse: 1839, interior do Rio Grande do Sul. Anahy (Aracy Esteves) é uma mulher forte, mãe de quatro filhos, todos de pais diferentes. Carregando uma carroça, ela luta para sobreviver em plena Revolução Farroupilha. Indiferente às paixões políticas, seu objetivo é sobreviver com o que consegue pilhar dos mortos nos combates.

Autor do cartaz: New Point
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Livre adaptação do texto “Mãe Coragem”, de Bertolt Brecht, cuja ação é transportada para o contexto da Revolução Farroupilha. Filme que marca a retomada da produção de longas-metragens no Rio Grande do Sul, após os anos de terra arrasada do governo Collor e do fim da Embrafilme.

 

 

 

 

 

Uma preciosidade de Benício no acervo da SMC

O interesse provocado por nossa última postagem no “Histórias do Cinema Gaúcho”, sobre o artista Benício, grande cartazista do cinema brasileiro, natural de Rio Pardo, faz com que voltemos a ele hoje, compartilhando uma informação que muitas pessoas desconhecem.

Embora tenha ficado famoso nacionalmente por seus icônicos cartazes e capas de livros e discos, Benício também se dedicou à pintura.

A Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre possui em seu acervo uma tela de grandes dimensões assinada pelo artista. Trata-se de uma leitura da ópera “Aída”, pintada por Benício em 1966.

Atualmente, a tela está exposta no gabinete do Secretário Municipal da Cultura, na Avenida Independência.

 

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “Não Aperta, Aparício!”

(1970, ficção, 105 minutos), de Pereira Dias. Com José Mendes, José Lewgoy, Grande Otelo, Alexandra Maria e Ana Amélia Lemos.

Sinopse: Na fronteira entre o estado do Rio Grande do Sul e o Uruguai, Aparício é o jovem herdeiro e gerente de uma fazenda importante da região. Mulherengo, sua vida parece acalmar-se com a chegada de Aurora, filha de um fazendeiro vizinho. No entanto, o capataz dos recém-chegados possui um plano para tomar a fazenda de Aparício.

Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Desenho e Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

Comédia popular, veículo para o cantor regionalista José Mendes, figura muito conhecida no Rio Grande do Sul. No elenco, atores de renome nacional como Grande Otelo e José Lewgoy, além da participação de Ana Amélia Lemos, que mais tarde abandonaria a carreira artística pela política, tornando-se senadora.

 

 

 

 

 

Mary Terezinha, a estrela mais popular do cinema gaúcho

Nascida em 30 de março de 1948, na cidade de Tupanciretã, Mary Terezinha Cabral Brum ficou conhecida como Mary Terezinha. Cantora e acordeonista, Mary manteve uma longa colaboração com o músico Vitor Mateus Teixeira (1927-1985), o popular Teixeirinha. A parceria da dupla teve início no começo da década de 1960 e se estendeu até 1984.

Além dos inúmeros discos que gravou com Teixeirinha, Mary Terezinha se notabilizaria pela série de filmes que protagonizou ao lado do parceiro a partir de 1967, com “Coração de Luto”. Foi o início de uma intensa carreira
cinematográfica, com grandes êxitos de bilheteria como “Motorista sem Limites”, “Ela Tornou-se Freira” e “Teixeirinha a 7 Provas”.

Entre 1967 e 1981, com “A Filha de Iemanjá”, que marcou sua despedida das telas, Mary Terezinha protagonizou nada menos que 12 longas junto com Teixeirinha. Um recorde até hoje não igualado por nenhuma outra atriz de cinema no Rio Grande do Sul.

Em 1992, Mary Terezinha lançou sua autobiografia “A Gaita Nua”, pela Editora Rígel.

Filmografia de Mary Terezinha:
1967 – Coração de Luto
1970 – Motorista sem limites
1972 – Ela Tornou-se Freira
1973 – Teixeirinha a 7 Provas
1975 – Pobre João
1976 – A Quadrilha do Perna Dura
1976 – Carmem, a Cigana
1977 – Na Trilha da Justiça
1978 – Meu Pobre Coração de Luto
1978 – O Gaúcho de Passo Fundo
1978 – Tropeiro Velho
1981 – A Filha de Iemanjá

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “O Negrinho do Pastoreio”

(1973, ficção, 89 minutos), de Antônio Augusto Fagundes. Com Grande Otelo, Breno Mello, Rejane Vieira Costa e Darcy Fagundes.

Sinopse: No início do século XIX, em uma estância de propriedade de um avarento que vive com a enteada, todos os escravos devotam-lhe ódio, à exceção de um negrinho que, em sua ingenuidade, não percebe a maldade do senhor. Chega à região, acompanhado de um negro livre, um gaúcho incumbido de domar potros. A moça se apaixona pelo forasteiro e o negro desperta nos escravos anseios de liberdade. O negrinho perde dois potros no pastoreio e é açoitado até a morte. Vingando-se, castelhanos atacam a fazenda. Os dois forasteiros e a moça aproveitam-se da confusão para abandonar a região.

Autor do cartaz: Benício
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

Adaptação da conhecida história do folclore gaúcho, imortalizada pelo escritor Simões Lopes Neto. No papel protagonista, o ator Grande Otelo, uma das grandes personalidades do cinema brasileiro. Ainda no elenco, Breno Mello, ator de “Orfeu Negro” (1959), de Marcel Camus, filme vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes e do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1960.

 

 

 

 

 

Os 35 anos da APTC-RS

Fundada em 8 de maio de 1985, a Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do Rio Grande do Sul está completando 35 anos de existência. A entidade surgiu a partir da iniciativa de profissionais da área com o objetivo de “lutar por condições de fomento financeiro e de material técnico que permitissem a instalação de um polo de produção de cinema no Rio Grande do Sul”. A primeira diretoria da APTC teve Henrique de Freitas Lima como presidente e Tony Rabatoni como vice e foi eleita em uma reunião no Museu da Comunicação Hipólito José da Costa, da qual participaram cerca de 30 pessoas.

Ao longo de quase quatro décadas de atuação, a APTC-RS tem desempenhado um papel decisivo para o estabelecimento de políticas públicas para o desenvolvimento do setor audiovisual no Estado, sendo responsável direta pelo projeto de criação da Cinemateca Capitólio, integrando hoje o Conselho Consultivo da instituição.

É importante destacar ainda que a APTC participou ativamente da criação do Fumproarte, das discussões da Lei Estadual de Incentivo à Cultura (inclusive de sua posterior regulamentação) e da negociação que criou o projeto Curta nas Telas. Em momentos de participação, foi uma das entidades mais atuantes na 1ª Conferência Municipal de Cultura (1995) e a principal entidade instituidora da Fundacine – Fundação Cinema RS (1998). Participou ainda do extinto CEPPAV- Comitê Executivo de Políticas Públicas do Audiovisual do Governo do Estado e foi membro ativo do PROCINE.

Em 2011, foi lançado o livro “APTC, 25 Anos – Eles Só Queriam Fazer seu Próximo Filme”, organizado por Carlos Scomazzoni, que resgata a história da entidade.

A atual diretoria da APTC é formada por Daniela Strack (presidenta), Richard Tavares (vice-presidente), Giordano Gio (2º vice-presidente), Rodrigo Scheid (1º secretário), Henrique Lahude (2º secretário), Joana Bernardes (3ª secretária), Matheus Piccoli (1º tesoureiro) e Fábio Duarte (2º tesoureiro).

* O livro “APTC, 25 Anos – Eles Só Queriam Fazer seu Próximo Filme” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

 

Cartaz: “Ainda Orangotangos”

(2007, ficção, 81 minutos), de Gustavo Spolidoro. Com Rafael Sieg, Janaína Kremer Motta, Renata de Lélis, Arlete Cunha e Roberto Oliveira.

Sinopse: Porto Alegre, no dia mais quente do verão. Um casal de imigrantes chineses cruza a cidade em um vagão de metrô. Doentes e cansados, eles tentam ajudar um ao outro, ao mesmo tempo em que enfrentam a desconfiança dos demais passageiros e a incompreensão de sua língua. O chinês vagueia pelos corredores da estação de metrô e pelo mercado público da cidade, em busca de ajuda. É o início de uma série de situações- limite vividas por diversos habitantes da cidade.

Autor do cartaz: Fábio Zimbres
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Adaptação do livro homônimo de Paulo Scott, este filme realizado pela produtora Clube Silêncio marcou a estreia na direção de longas do premiado curta-metragista Gustavo Spolidoro. Rodado em um único plano-sequência, sem nenhum corte, “Ainda Orangotangos” ganhou o prêmio de melhor filme no Festival de Cinema de Milão.

 

 

 

 

 

Tony Rabatoni, um fotógrafo do Cinema Novo no Rio Grande do Sul

O paulista Tony Rabatoni (1927-1995) foi um dos diretores de fotografia mais respeitados e requisitados do cinema brasileiro.

Na década de 1950, atuou na Vera Cruz como assistente de direção em filmes do popular cômico Mazzaropi (“Sai da Frente”, “Nadando em Dinheiro”), mas é a partir dos anos 60 que Tony começa a estabelecer sua reputação como diretor de fotografia em obras como “Cidade Ameaçada” (1960), de Roberto Farias, “Os Cafajestes” (1962), de Ruy Guerra, e “Barravento” (1969), de Glauber Rocha.

Ao longo da década de 1970, assinou a fotografia de pornochanchadas de sucesso, entre elas “O Libertino” (1973), de Victor Lima, e “Ainda Agarro Esta Vizinha” (1974), de Pedro Carlos Rovai. Também nessa época, Rabatoni passa a trabalhar regularmente em produções gaúchas, como diretor de fotografia de três longas do cantor e compositor Teixeirinha, “Na Trilha da Justiça” (1977), de Milton Barragan, “Tropeiro Velho” (1978), de Milton Barragan, e “O Gaúcho de Passo Fundo” (1978), de Pereira Dias.

Além de seu trabalho como fotógrafo, Rabatoni dirigiu quatro longas, “Vidas Estranhas” (1968), co-dirigido por Itamar Borges, “O Vale dos Amantes” (1982), “Põe Devagar… Bem Devagarinho” (1983) e “A Doutora é Boa Paca” (1984).

Em 1985, Rabatoni foi um dos sócios fundadores e integrou a primeira diretoria da Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do RioGrande do Sul, a APTC-RS.

Tony Rabatoni faleceu em 1995, e hoje seu acervo pessoal está depositado na Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “O Gaúcho de Passo Fundo”

(1978, ficção, 107 minutos), de Pereira Dias. Com Teixeirinha, Mary Terezinha, Jimmy Pipiolo e Darcy Fagundes.

Sinopse: Rico fazendeiro de Passo Fundo salva a vida de uma garota, atacada por perigosos bandidos. Então ele descobre que a moça toca acordeon e com ela forma uma dupla.

Autor do cartaz: Benício
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

Décimo longa-metragem estrelado pelo casal Teixeirinha e Mary Terezinha, um fenômeno de popularidade do cinema gaúcho, mais uma vez dirigidos por Pereira Dias, habitual colaborador da dupla.

 

 

 

 

 

Projeto Raros, 17 anos

Neste mês de maio, um dos projetos mais longevos e queridos pelos cinéfilos porto-alegrenses completa 17 anos de atividade ininterrupta.

“Filmes que você sempre quis ver ou nem imaginava que existiam”. Foi a partir desse conceito, logo transformado no slogan do projeto, que a Sala P.F. Gastal, localizada no terceiro andar da Usina do Gasômetro (hoje
fechada), deu início às sessões do Raros, realizadas nas noites de sexta-feira, com entrada franca e quase sempre lotadas. O projeto surgiu a partir de conversas entre o então programador da Sala P. F. Gastal, Marcus Mello, e o cinéfilo, crítico, pesquisador e colecionador de filmes Carlos Thomaz Albornoz. Em sua primeira fase, boa parte dos títulos exibidos saíam do acervo de Albornoz, mas com o tempo foram surgindo outras contribuições.

Concebido com a intenção de apresentar ao público local filmes nunca lançados no circuito exibidor brasileiro ou há muito tempo fora de circulação nos cinemas, o Raros procura reproduzir o espírito das “midnight movies” realizadas em Nova York a partir do final dos anos 60.

Cada filme é apresentado uma única vez, e as sessões são comentadas. O filme que inaugurou o Raros foi a produção russa de horror “Viy – O Espírito do Mal” (1967), de Konstantin Yershov e Georgy Kropachyov,
exibido no dia 2 de maio de 2003.

Imediatamente acolhido pelos cinéfilos porto-alegrenses, o Raros teve um sucesso instantâneo e logo inspiraria outras iniciativas similares, a mais conhecida delas sendo as Sessões do Comodoro, organizadas pelo cineasta Carlos Reichenbach no Cinesesc de São Paulo. Reichenbach era um admirador confesso do Raros e também cedeu filmes de sua coleção para exibição no projeto. Em 22 de junho de 2007, o saudoso “Carlão” veio a Porto Alegre participar da sessão de número 100 do Raros, exibindo uma cópia restaurada de seu filme “Lilian M – Relatório Confidencial” (na foto, um registro histórico daquela noite, com Reichenbach entre Carlos Thomaz Albornoz e Milton do Prado, primeiro programador da Sala P. F. Gastal e atualmente coordenador do Curso de Realização Audiovisual da Unisinos).

Com o fechamento da Sala P. F. Gastal, em 2017 o Raros transferiu suas sessões para a Cinemateca Capitólio, onde, no dia 23 de março de 2018, celebrou a sua sessão de número 200, com uma maratona de filmes ao longo da madrugada.

A arte do projeto Raros foi criada pela dupla Gustavo Jahn e Melissa Dullius.

 

 

 

 

 

Cartaz: “Me Beija”

(1984, ficção, 83 minutos), de Werner Schünemann. Com Nina de Pádua, Rudi Lagemann, Breno Ruschel, Ney Laux e Angel Palomero.

Sinopse: Vera é professora numa escola do interior da serra gaúcha. Raul está apaixonado por Vera e é correspondido, mas eles não conseguem levar adiante a relação por conta de suas expectativas pessoais conflitantes. Problemas com alunos levam Vera a um processo de auto questionamento que cria um impasse. Uma grande opção tem de ser feita. Raul vai passar uns dias numa escola do interior da serra gaúcha, cujo diretor é Sartori, um velho conhecido. Na escola, Raul conhece Vera e ambos passam a ter um relacionamento. Numa festa escolar, Raul conhece a aluna Marília e transam numa sala de aula. Sartori inquire Raul sobre o relacionamento com a aluna, mas é ameaçado de chantagem. Raul resolve partir, entra num bar e suicida-se, com um tiro na boca. Vera deixa uma carta com o amigo Leandro, na esperança de que o amado retorne, e parte para o Rio.

Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Ilustração e Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Drama intimista que recebeu vários prêmios no Festival de Brasília e no Rio Cine Festival, e foi bastante elogiado pela crítica à época de sua estreia nos cinemas. Um dos três longas realizados de forma cooperativada pela produtora Z na década de 80 (os outros dois foram “Verdes Anos” e “Aqueles Dois”), em uma iniciativa que marcou época na história do cinema gaúcho.

 

 

 

 

Breno Mello, o Orfeu negro

Jogador de futebol revelado pelo time Renner, o gaúcho Breno Mello (1931-2008) viveu uma história única no cinema internacional. Após seu time ter conquistado o título de campeão estadual em 1954, vencendo os favoritos Grêmio e Internacional, Breno foi jogar no Rio de Janeiro. Lá acabaria sendo escolhido para interpretar o protagonista do filme francês “Orfeu do Carnaval” (Orfeu Negro), de Marcel Camus, adaptação da peça de Vinicius de Moraes que transporta o mito do poeta grego Orfeu para a favela carioca. Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes em 1959 e do Oscar de melhor filme estrangeiro em 1960, “Orfeu do Carnaval” foi um êxito mundial, colocando seu ator Breno Mello numa vitrine privilegiada.

Infelizmente o sucesso de Breno como ator foi efêmero. Na década de 60, ainda embalado pela projeção conquistada por “Orfeu do Carnaval”, atuou em três filmes. Em 1973, faria a sua única participação no cinema gaúcho, integrando o elenco de “O Negrinho do Pastoreio”, de Antônio Augusto Fagundes. Em 1988, despediu-se das telas na produção internacional “Prisioneiro do Rio”, dirigido pelo polonês Lech Majewski, sobre o ladrão Ronald Biggs.

Em 2005, a incrível trajetória de Breno foi contada no documentário francês “À Procura de Orfeu Negro”, de René Letzgus e Bernard Tournois, que o levaria de volta ao Festival de Cannes. O documentário, exibido no festival francês 46 anos após a estreia consagradora de “Orfeu do Carnaval” em 1959, permitiu que Mello revivesse seus dias de glória no tapete vermelho de Cannes.

Pouco mais tarde, em 11 de julho de 2008, o porto-alegrense Breno Mello morreria em sua cidade natal, aos 76 anos de idade. Uma história de vida que dava um filme.

* Nas fotos, Breno Mello em “Orfeu do Carnaval” e numa sessão de gala do filme no Palácio das Laranjeiras, no Rio de Janeiro, junto ao presidente Juscelino Kubitschek, ao escritor Vinicius de Moraes e à atriz Marpessa Dawn, sua companheira de elenco, que coincidentemente também faleceria em 2008, em Paris, um mês após a morte de Breno.

Filmografia de Breno Mello:

“Orfeu do Carnaval” (1959), de Marcel Camus
“Os Vencidos” (1963), de Glauco Couto
“Rata de Puerto” (1963), de René Mugica
“O Santo Módico” (1964), de Robert Mazoyer
“O Negrinho do Pastoreio” (1973), de Antônio Augusto Fagundes
“Prisioneiro do Rio” (1988), de Lech Majewski

 

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “Vento Norte”

 

(1951, ficção, 76 minutos), de Salomão Scliar. Com Roberto Bataglin, Berta Scliar, Manoel Macedo e Patrícia Diniz.

Sinopse: A luta árdua de uma comunidade de pescadores da costa sul do Atlântico, envolvidos em violenta tragédia sob a estranha pressão de uma ventania que sopra do norte e que traz consigo a miséria e reações violentas, transformando homens simples do mar em figuras guiadas pelo instinto primário da vingança e do ódio.

Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Uma obra seminal do cinema gaúcho, é o primeiro longa-metragem de ficção sonoro realizado no Rio Grande do Sul. Filmado em Torres, “Vento Norte” se destaca, entre outros aspectos, por sua belíssima fotografia em preto e branco. Foi o filme exibido na inauguração da Cinemateca Capitólio, em 27 de março de 2015.

 

 

 

 

 

O triste fim dos cinemas de rua

 

A década de 90 do século passado foi um momento particularmente triste para os cinéfilos, marcado pelo fechamento dos grandes cinemas de rua, fenômeno observado em escala mundial.

Em Porto Alegre não foi diferente. O impacto provocado pelo advento do “home video” e a gradativa transferência das salas de cinema para os shopping centers, motivada sobretudo pelo crescimento da violência urbana, encerrou a história de alguns dos mais tradicionais e queridos espaços de exibição da capital gaúcha.

O ano de 1994 foi especialmente devastador. Só naquele ano fecharam suas portas o ABC, o Cacique, o Scala, o Capitólio, o Cinema 1 – Sala Vogue, o Coral (então com duas salas), o Lido, o São João e o Marrocos.

Entre eles, apenas o Capitólio conseguiu renascer das cinzas, voltando às atividades totalmente restaurado, agora como Cinemateca Capitólio, em 27 de março de 2015.

* Estas e outras histórias sobre as salas de cinema de Porto Alegre estão no livro “The End – Cinemas de Calçada em Porto Alegre (1990-2005)”, lançado por Cristiano Zanella em 2006. O livro está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “Ela Tornou-se Freira”

 

(1972, ficção, 116 minutos), de Pereira Dias. Com Teixeirinha, Mary Terezinha, Jimmy Pipiolo, Rosana Martins e Ricardo Hoeper.

Sinopse: Uma gang internacional envia da Itália, para Teixeirinha, um violão contendo documentos que deverão ser recapturados no Brasil. Para isso, a gang utiliza uma garota, Sandra, para seduzir o cantor. A mulher deste, Mary Terezinha, julga-se traída e, desiludida, vai para o convento. O empresário de Teixeirinha, Dom Chiquito, tenta remediar a situação. Teixeirinha é alvo de um atentado, sendo salvo – sem querer – por sua própria esposa, agora convertida em freira. Os bandidos são presos e, graças a Dom Chiquito, Mary Terezinha volta a se reunir ao marido durante um grande show circense em benefício do Natal da criança pobre.

Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

Terceiro filme estrelado por Teixeirinha e Mary Terezinha, foi um dos grandes sucessos de bilheteria da carreira cinematográfica da dupla. O
diretor Pereira Dias (1926-1988) se mantém até hoje como o mais profícuo realizador do cinema gaúcho, tendo assinado 11 longas no Rio Grande do Sul ao longo de uma década de intensa atividade, entre os anos de 1969 (com “Pára, Pedro!”) e 1979 (com “Domingo de Grenal”).

 

 

 

 

Eduardo Abelim, pioneiro do cinema

 

Nascido em Cachoeira do Sul, em 1900, Eduardo Abelim é um dos pioneiros do cinema no Brasil e sua movimentada trajetória de vida incluiu, além da realização cinematográfica, atividades como a quiromancia e o automobilismo. Ao transferir-se para Porto Alegre, Abelim dirige em 1926 o curta “Em Defesa da Irmã”, fundando no ano seguinte a sua própria produtora, a Gaúcha Film.

Abelim é o verbete de abertura da “Enciclopédia do Cinema Brasileiro”, obra de referência lançada no ano 2000 pela Editora SENAC, com organização de Fernão Ramos e Luiz Felipe Miranda. Sobre ele, discorre Luiz Felipe Miranda: “Em 1930, dirige o documentário “A Avançada das Tropas Gaúchas”, registro do envolvimento dos gaúchos na Revolução de 30.

Produz, dirige e atua em dois dramas. Com “O Castigo do Orgulho” inicia um pequeno ciclo gaúcho de filmes mudos de ficção, de maior metragem, que ele próprio encerra com “O Pecado da Vaidade”. Consta ter utilizado nesses filmes, como atrizes, mulheres da vida”.

Em 1932, Eduardo Abelim muda-se para Niterói, dedicando-se à exibição de filmes em praças públicas.

Eduardo Abelim morreu em 1984.

Em 1985, o diretor Lauro Escorel Filho levou a história de Abelim para o cinema no longa “Sonho sem Fim”, filmado em Pelotas, com o ator Carlos Alberto Riccelli como protagonista.

Filmografia de Eduardo Abelim:

“Em Defesa da Irmã” (1926)
“O Castigo do Orgulho” (1927)
“A Avançada das Tropas Gaúchas” (1930)
“O Pecado da Vaidade” (1932)

* Na foto, rara imagem preservada de “O Castigo do Orgulho”.

 

 

 

 

 

Cartaz: “Castanha”

 

(2014, ficção, 95 minutos), de Davi Pretto. Com João Carlos Castanha, Celina Castanha, Zé Adão Barbosa e Lauro Ramalho.

Sinopse: João Carlos Castanha tem 52 anos e é ator. Também trabalha na noite como transformista em festas do circuito gay porto-alegrense. Solitário, doente e confuso, aos poucos ele deixa de discernir realidade e ficção.

Autor do cartaz: Rafael Poloni
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Longa de estreia de Davi Pretto, que borra os limites entre a ficção e o documentário ao retratar o cotidiano do ator e transformista João Carlos Castanha. Primeiro longa-metragem gaúcho a participar da seleção oficial do Festival de Cinema de Berlim, na prestigiada seção Forum.

 

 

 

 

Ponto de Cinema, 40 anos

 

Um dos espaços mais importantes para a cinefilia porto-alegrense ao longo da década de 80 do século passado, o Ponto de Cinema estaria completando 40 anos de existência em 2020.

Inaugurado em março de 1980, por iniciativa do cinéfilo Carlos Schmidt, sua história breve e intensa deixou uma forte marca na vida cultural da cidade. O Ponto de Cinema se notabilizou pelas mostras retrospectivas, pela exibição de filmes clássicos e pela difusão de cinematografias às quais o circuito de salas comerciais dava pouca atenção, trazendo filmes do Japão, da Espanha, da Suíça, da Alemanha, da França, da Argentina e dos países do leste europeu.

Em seu livro “Salas de Cinema: Cenários Porto -Alegrenses”, lançado em 1999, Susana Gastal resgata a trajetória do Ponto de Cinema, que até hoje é lembrado com saudade por aqueles que tiveram o privilégio de frequentá-lo: “Em 15 de março de 1980 acontece a primeira sessão do Ponto de Cinema, criado por Carlos Schmidt como um espaço para apresentar a produção de filmes em super-8 e 16mm. Nos primeiros seis meses, quando Schmidt realiza as sessões na Sala Álvaro Moreyra, no Centro Municipal de Cultura, um público considerado excelente – uma média de setenta pessoas por sessão – assiste a dezoito produções gaúchas e seis alemãs. Mas, quando a imprensa lhe dá espaço, Schmidt aproveita para se queixar da falta do apoio do poder público, da iniciativa privada e mesmo da própria imprensa, na qual julga receber pouco espaço para divulgação.

Depois, as projeções passam a ser realizadas no Teatro de Câmara e, entre 1982 e 1986, o Ponto de Cinema funciona de forma itinerante, ocupando espaços no Instituto Goethe, Assembleia Legislativa, Senac e até no Instituto de Artes, da Universidade Federal. Em setembro de 1986, Schmidt transfere sua proposta para a sala do Sesc, localizada na avenida Alberto Bins, onde funciona até que um incêndio destrói o local, em 25 de abril de 1992.”

Após o encerramento definitivo das atividades do Ponto de Cinema, Carlos Schmidt inauguraria o Guion, que abriu suas portas em 22 de junho de 1995, no Centro Comercial Olaria. Era o início de um circuito de salas também muito importante, que foi se expandindo ao longo dos anos e, apesar das crises, se mantém até hoje em funcionamento.

* O livro “Salas de Cinema: Cenários Porto-Alegrenses” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

 

Cartaz: “Teixeirinha a Sete Provas”

 

(1973, ficção, 114 minutos), de Milton Barragan. Com Teixeirinha, Mary Terezinha, Jimmy Pipiolo e Themis Ferreira.

Sinopse: Don Chiquito é procurado pelo mordomo de uma senhora rica, viúva de um lorde inglês, que deseja fazer uma proposta a Teixeirinha. A viúva está prestes a morrer e tenciona deixar sua fortuna para o cantor, seu grande ídolo. Porém, para receber a herança, Teixeirinha deve provar que é digno dela, enfrentando os testes de coragem, com ousadia e inteligência, que a viúva lhe propõe.

Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

Quarto filme estrelado por Teixeirinha e Mary Terezinha, costuma ser citado como o melhor e mais bem sucedido trabalho da dupla no cinema. A direção é de Milton Barragan, habitual colaborador de Teixeirinha, a quem dirigiria em outros quatro filmes.

 

 

 

 

Luiza Maranhão, a atriz que virou estrela do Cinema Novo

 

Nascida em Canoas, em 1940, Luiza Maranhão ficaria conhecida como a deusa negra do Cinema Novo, graças à sua participação em clássicos como “Barravento” (1962), de Glauber Rocha, e “Ganga Zumba” (1963), de Carlos Diegues.

O pesquisador Adilson Marcelino, em seu site “Mulheres do Cinema Brasileiro”, resume bem a trajetória da atriz no cinema: “Com sua beleza impactante, Luiza Maranhão deu veracidade e estilo próprio para as personagens que interpretou, em uma carreira de poucos, mas importantes filmes. Dois de seus maiores momentos foram a Maria de “A Grande Feira”, de Roberto Pires, e a Zulmira de “Assalto ao Trem Pagador”, de Roberto Farias.

Luiza Maranhão deu-se ao luxo de ter uma filmografia quase cem por cento composta de clássicos. Depois de carreira como cantora em rádios gaúcha e paulista, e como atriz no teatro carioca, tem estreia de prestígio nas telas através do cinema baiano. Primeiro em “A Grande Feira”, de Roberto Pires, e em seguida pelas mãos de Glauber Rocha em “Barravento”, primeiro longa-metragem do cineasta.

A atriz sempre foi capaz de criar personagens dramáticos, mas mantendo uma certa distância altiva com o encenado. Em sua trajetória cinematográfica disponibilizou seu talento para diretores do primeiro time, e que ajudaram a escrever a história do cinema brasileiro: Roberto Pires, Glauber Rocha, Roberto Farias, Carlos Diegues, Leon Hirszman e Walter Lima Jr.”.

Luiza Maranhão abandonou o cinema na década de 80. Seu último filme foi “Chico Rei” (1985), dirigido por Walter Lima Jr. A atriz vive em Roma, na Itália, e em setembro deste ano comemora 80 anos de idade.

Infelizmente, Luiza Maranhão nunca participou de qualquer filme no Rio Grande do Sul, seu estado natal.

* Nas fotos, Luiza Maranhão, que também atuou como modelo, fotografada por Evandro Teixeira, e nos filmes “A Grande Feira” e “Barravento”.

Filmografia Luiza Maranhão

“A Grande Feira” (1961), de Roberto Pires
“Barravento” (1962), de Glauber Rocha
“Assalto ao Trem Pagador” (1962), de Roberto Farias
“Ganga Zumba” (1963), de Carlos Diegues
“A Grande Cidade” (1966), de Carlos Diegues
“Garota de Ipanema” (1967), de Leon Hirszman
“Boi de Prata” (1973), de Augusto Ribeiro Jr.
“Chico Rei” (1985), Walter Lima Jr.

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “O Grande Rodeio”

 

(1975, ficção, 103 minutos), de Antônio Augusto Fagundes. Com Rejane Schumann, Antônio Augusto Fagundes, Darcy Fagundes e Alberto Ruschel.

Sinopse: A filha de um rico fazendeiro do Rio Grande do Sul despreza os valores que mais sensibilizam seu pai, um gaúcho ligado às tradicionais manifestações da cultura de seu estado. Para o pai, isso ocorre por influência do noivo da filha, um jovem carioca de hábitos e costumes alienígenas. Visitando o pai, a filha encontra-o empenhado na realização de um grande rodeio em sua cidade natal. Aproveitando sua estada na fazenda, o pai pede a um amigo, professor e estudioso do folclore gaúcho, que ensine um pouco da cultura gaúcha à filha. As aulas começam, mas as diferentes visões culturais de um e outro acabam gerando acaloradas discussões que, ao invés de afastá-los, aproxima-os numa ardente paixão. A chegada do noivo provoca um duelo entre ele e o professor. Derrotado, o ex-noivo regressa ao Rio e tem início o rodeio com a apresentação de artistas gaúchos.

Autor do cartaz: Jeam
Técnica: Desenho
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

Segundo longa dirigido pelo tradicionalista Antônio Augusto Fagundes, após “O Negrinho do Pastoreio” (1973), lançado dois anos antes. O filme é uma exaltação das tradições gaúchas, reunindo em seu elenco vários nomes importantes do movimento tradicionalista do Rio Grande do Sul, como o próprio Antônio Fagundes Filho, Leopoldo Rassier, Barbosa Lessa, os grupos Os Serranos, Os Tauras e Os Araganos, entre outros.

 

 

 

 

“Torres” (1927), um documentário perdido

O documentário “Torres”, de José Picoral (1927), é um dos tesouros perdidos do cinema brasileiro. Este média-metragem sobre a praia de Torres, no litoral gaúcho, já foi apontado como um dos possíveis primeiros filmes da história do cinema a retratar o trabalho braçal do homem (no caso, pescadores em atividade no alto mar), pois sua realização antecede o clássico “Drifters”, realizado em 1929 pelo inglês John Grierson, considerado por historiadores como o primeiro documentário a abordar o tema.

O folheto de divulgação em anexo é um raríssimo documento sobre o filme que conseguiu sobreviver. Foi a primeira doação (feita pelo crítico de cinema Hélio Nascimento, do “Jornal do Comércio”) ao Centro de Documentação e Memória da Cinemateca Capitólio após a sua inauguração, em março de 2015.

Em entrevista recente publicada em seu site “Escrita Crítica”, a jornalista, pesquisadora e crítica de cinema Fatimarlei Lunardelli conversa com Hélio Nascimento sobre “Torres”: “Quando começou a trabalhar no “Jornal do Comércio” Hélio conheceu Picoral, que tinha alcançado notável reconhecimento com sua obra realizada
em 1927 para divulgar a praia e o balneário onde seu pai José Antônio Picoral havia fundado, em 1915, o Balneário Picoral, tornando-se pioneiro do turismo. O documentário é considerado o filme de publicidade turística mais antigo do estado. Hélio nos conta que o referido filme havia sido exibido a Paulo Emílio Salles Gomes, mentor da Cinemateca Brasileira que vinha com frequência para atividades cinematográficas em Porto Alegre. O crítico paulista ficou entusiasmadíssimo porque o filme de Picoral tinha o pioneirismo de cenas filmadas em alto-mar, mostrando pescadores em suas lides. Paulo Emílio assegurou que eram imagens anteriores às inovações introduzidas pela escola documentarista inglesa fundada por John Grierson e levou a cópia para depósito na Cinemateca Brasileira. O nitrato do qual eram feitas as películas entrava com facilidade em combustão com o aumento do calor e num dos incêndios da Cinemateca o filme foi destruído.

Foi uma lástima, pois não havia mais negativo de “Torres”, esse já tinha se perdido na Alemanha, nos escombros da Segunda Guerra. Sendo neto de imigrante alemão que havia chegado ao estado no início do século, José Antônio Picoral Júnior teve a oportunidade de visitar a terra dos ancestrais a convite da embaixada alemã. Foi uma viagem extraordinária que incluiu um encontro com Hitler, apresentação de seu filme e depósito em acervo fílmico posteriormente destruído nos bombardeios da guerra. Picoral contou essas histórias ao jovem crítico e lhe deu o cartaz original do filme do qual nada mais restava. Hélio depositou esse precioso documento recentemente na Cinemateca Capitólio”.

(A entrevista completa está em https://escrita.art.br/conversa-com-helio-nascimento/ ).

 

 

 

 

Cartaz: “A Cidade dos Piratas”

 

(2018, animação, 80 minutos), de Otto Guerra. Com Marco Ricca, Matheus Nachtergaele, Marcos Contreras, Otto Guerra e Laerte.

Sinopse: Um diretor de cinema enfrenta uma situação complexa no meio da produção de seu longa-metragem, uma adaptação de “Piratas do Tietê”, quando a autora Laerte começa a rejeitar os personagens do roteiro. Para tentar salvar o projeto, ele decide contar a sua história e a partir daí realidade e ficção começam a se misturar.

Autor do cartaz: Laerte
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Longa de animação que adapta de forma muito livre a obra da cartunista Laerte, e também inclui na trama elementos autobiográficos, como as crises criativas e os problemas de saúde enfrentados pelo diretor Otto Guerra. Vencedor do Coral de melhor longa de animação no Festival de Havana em 2019, um dos prêmios mais importantes já conquistados pelo cinema gaúcho.

 

 

 

 

Cine Marrocos (1953-1994), um gigante dos cinemas de bairro

 

Localizado na Avenida Getúlio Vargas, no Menino Deus, o Cine Marrocos permanece na memória dos espectadores que o conheceram como um dos maiores e mais confortáveis cinemas de bairro de Porto Alegre, uma sala que se diferenciava ainda pelo tamanho de sua tela e pela qualidade de sua projeção.

O Marrocos abriu suas portas em 26 de setembro de 1953 (a inauguração contou com a presença do prefeito da época, Ildo Meneghetti). A sala, em estilo modernista, contava com 1300 lugares, distribuídos em uma única e extensa plateia (sem mezanino). Ao longo de sua história bateu recordes de público exibindo filmes como “A Noviça Rebelde” e “Lawrence da Arábia”.

Segundo um de seus antigos frequentadores, Milton Ribeiro, o Marrocos era “verdadeiramente imenso, azul e absolutamente frio durante o inverno”.

A tradicional sala do bairro Menino Deus fechou suas portas em 30 de junho de 1994, com a plateia reduzida para 700 lugares.

 

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “Antes que o Mundo Acabe”

 

(2009, ficção, 100 minutos), de Ana Luiza Azevedo. Com Pedro Tergolina, Caroline Guedes, Eduardo Lacerda, Eduardo Moreira e Murilo Grossi.

Sinopse: Daniel é um adolescente crescendo em seu pequeno mundo com problemas que lhe parecem insolúveis: como lidar com uma namorada que não sabe o que quer, como ajudar um amigo que está sendo acusado de roubo e como sair da pequena cidade onde vive. Tudo começa a mudar quando ele recebe uma carta do pai que ele nunca conheceu. Em meio a todas essas questões, ele será chamado a realizar suas primeiras escolhas adultas e descobrir que o mundo é muito maior do que ele pensa.

Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Primeiro longa-metragem de Ana Luiza Azevedo, que vinha de uma premiada trajetória anterior como curta-metragista. O filme teve sua primeira edição no Festival de Paulínia, em julho de 2009, estreando nos cinemas no ano seguinte, conquistando vários prêmios e críticas elogiosas, como a de José Geraldo Couto, que afirmou tratar-se de “um ‘Jules e Jim’ adolescente, combinando o humor esperto de Jorge Furtado (um dos roteiristas) com a notável delicadeza da diretora”.

 

 

 

 

“Moviola”, a revista do Clube de Cinema de Porto Alegre

 

Uma das ações comemorativas dos 35 anos de atividade do Clube de Cinema de Porto Alegre, celebrados em 1983, a revista “Moviola” durou quatro anos, tendo lançado um total de oito números ao longo desse período, entre agosto de 1983 e maio de 1987. O então presidente do Clube de Cinema, Marco Antônio Campos, coordenava a publicação, que contava em sua equipe de editores com Maria Lúcia Fróes, Marco Antônio Papaleo e Tuio Becker.

Sem se restringir à mera cobertura dos lançamentos do circuito comercial, a “Moviola” costumava produzir dossiês temáticos (como aqueles dedicados ao cinema fantástico, ao Festival de Gramado ou ao cinema gaúcho) e a publicar entrevistas com cineastas (Cacá Diegues, João Batista de Andrade, Walter Hugo Khouri). Além da participação de críticos de cinema locais, a “Moviola” teve contribuições de personalidades convidadas como Rubens Ewald Filho, Moacyr Scliar, Luís Fernando Veríssimo, Carlos Reichenbach e Leon Cakoff. Segundo palavras de Tuio Becker, a revista buscava um “equilíbrio entre textos e fotos, e entre matérias sobre o cinema internacional, brasileiro e gaúcho”.

* A coleção completa da revista “Moviola” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 

 

 

 

 

Cartaz:“A Invenção da Infância”

 

(2000, documentário, 26 minutos), de Liliana Sulzbach.

Sinopse: A partir do pressuposto de que “ser criança não significa ter infância” uma análise sobre as diferenças entre meninos e meninas do sul do Brasil e crianças que vivem no interior do Nordeste, denunciando o trabalho infantil e as exigências de desempenho a que elas são submetidas.

Autor do cartaz: Flávio Wild
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Um dos documentários mais premiados da história do cinema gaúcho, este filme-ensaio assinado pela diretora Liliana Sulzbach apresenta uma dura reflexão sobre a fragilidade da condição da infância no mundo contemporâneo. Entre os colaboradores do filme, está o músico Nico Nicolaiewsky, que assina a trilha sonora.

 

 

 

 

Aníbal Damasceno Ferreira, um mestre que ensinou o cinema a várias gerações

Um dos grandes intelectuais do Rio Grande do Sul, apaixonado por cinema e literatura, mestre de várias gerações como professor de cinema na PUCRS a partir de 1978, Aníbal Damasceno Ferreira (1933-2013) contribuiu em diversas frentes para a consolidação da produção cinematográfica no Estado.

Aníbal nasceu em Erechim e sua paixão pelo cinema se manifestou ainda na infância, por influência do pai, que era ator. Em Porto Alegre, começou sua carreira trabalhando como operador de rádio na UFRGS e, depois, na Rádio Farroupilha.

Seu interesse pelo cinema o levou a trabalhar para produtoras como a Leopoldis-Som e a Interfilms, roteirizando diversos documentários e cinejornais. No início da década de 1970, assinou o roteiro de três longas, “Gaudêncio, o Centauro dos Pampas” (1971), de Fernando Amaral, com Paulo José, Dina Sfat e José Lewgoy no elenco; “Motorista sem Limites” (1970) e “Teixeirinha a 7 Provas” (1972), de Milton Barragan, ambos estrelados por Teixeirinha.

Entre as tantas contribuições de Aníbal Damasceno Ferreira cabe citar ainda o ensaio “Os Pêssegos de Saint-Hilaire (Ensainho sobre o Cinema Gaúcho)”, publicado pela primeira em 1972, no jornal “Correio do Povo”, uma reflexão seminal sobre a produção cinematográfica no Rio Grande do Sul. O texto foi reeditado no livro “Cinema Gaúcho: Diversidades e Inovações” (Editora Sulina/2009), organizado por Cristiane Freitas Gutfreind e Carlos Gerbase.

Uma publicação no site da PUCRS destaca a trajetória intelectual de Aníbal Damasceno Ferreira, e também sua atuação em sala de aula: “Seus alunos lembram do professor pelo tom de voz baixo e explicações calmas que, bruscamente, alteravam-se para rompantes dramáticos, com Aníbal subindo nas mesas da sala de aula, no intuito de exemplificar um estilo de enquadramento de câmera ou a dramatização de uma cena. Sua atuação na cena cultural gaúcha foi de grande relevância.

Aníbal, junto com outros idealistas, foi responsável pela criação do Festival de Cinema de Gramado. Leitor voraz, era especialista em Machado de Assis e Nelson Rodrigues. Nos anos 1950, descobriu a obra do dramaturgo Qorpo Santo, tornando-se um grande incentivador dos textos desse autor.

O filme “3 Efes” (2007), dirigido por Carlos Gerbase, foi inspirado em uma teoria do professor Aníbal Damasceno Ferreira, que morreu em 2013, deixando um acervo com mais de mil e
quatrocentos livros, um roteiro inédito de longa-metragem e materiais para uso em sala de aula”.

* Na foto, Aníbal Damasceno Ferreira em cena de “3 Efes”, de Carlos Gerbase, no qual trabalhou como ator.

 

 

 

 

Cartaz: “Motorista sem Limites”

 

(1970, ficção, 100 minutos), de Milton Barragan. Com Teixeirinha, Mary Terezinha, Walter D’Ávila e Jimmy Pipiolo.

Sinopse: A namorada do caminhoneiro Jorge, Angelita, torna-se refém de uma quadrilha de criminosos que assaltam bancos na capital Porto Alegre e depois fogem para o interior, como modo de despistar a polícia. Com a ajuda do detetive Leão e de seu amigo Apolônio, Jorge enfrentará os bandidos para resgatar sua amada.

Autor do cartaz: Luiz Ufanil
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira

Segundo longa-metragem protagonizado por Teixeirinha e Mary Terezinha, após o sucesso de “Coração de Luto”, lançado em 1967. Já ambicionando a conquista de público em âmbito nacional, Teixeirinha escala o conhecido comediante Walter D’Ávila para o elenco. A participação de D’Ávila no filme é amplamente explorada na arte do cartaz, garantindo ao ator o mesmo destaque dado a Teixeirinha. Primeiro filme colorido da dupla, e também a primeira colaboração deles com o diretor Milton Barragan e com o ator Jimmy Pipiolo, a partir daí parceiros constantes em seus filmes. Na equipe técnica de “Motorista sem Limites”, destaque para a presença de Dib Lutfi (como operador de câmera), um renomado profissional ligado ao Cinema Novo, conhecido por suas contribuições recentes com Leon Hirszman (“A Falecida”), Carlos Diegues (“A Grande Cidade”) e Glauber Rocha (“Terra em Transe”), entre outros.

 

 

 

 

O dia em que Catherine Deneuve passou por aqui

 

Em 31 de agosto de 1984, os porto-alegrenses testemunharam um dos acontecimentos mais extraordinários na vida da capital gaúcha até aquele momento: a visita da maior estrela do cinema francês, Catherine Deneuve, que veio a Porto Alegre participar da campanha de lançamento de uma linha de jóias da H. Stern.

Ícone do cinema internacional, atriz de Buñuel (“A Bela da Tarde”, “Tristana”), Polanski (“Repulsa ao Sexo”), Truffaut (“A Sereia do Mississipi”, “O Último Metrô”), Demy (“Duas Garotas Românticas”, “Pele de Asno”) e tantos outros, Deneuve estava, aos 41 anos, no auge de sua beleza, e pouco tempo antes havia causado furor entre os cinéfilos porto-alegrenses com o filme “Fome de Viver” (1983), de Tony Scott, no qual interpretava a vampira Miriam Blaylock, ao lado de David Bowie e Susan Sarandon.

Durante a coletiva de imprensa realizada no hotel Plaza São Rafael, Catherine Deneuve fumou sem parar, e foi presenteada por um grupo de críticos de cinema gaúchos com um exemplar da revista “Moviola”, editada pelo Clube de Cinema de Porto Alegre.

Não há registro conhecido de que algum cineasta local tenha aproveitado a ocasião para convidar a atriz a protagonizar um filme gaúcho.

A visita de Catherine Deneuve foi um fato tão inesperado na pacata rotina de Porto Alegre que, pouco antes, no dia 24 de agosto, sua chegada à cidade seria anunciada por uma forte e improvável nevasca, algo que não ocorria há 70 anos.

* Fotos de Lisette Guerra.

 

 

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “O Homem que Copiava”

 

(2003, ficção, 124 minutos), de Jorge Furtado. Com Lázaro Ramos, Leandra Leal, Pedro Cardoso e Luana Piovani.


Sinopse: André, 20 anos, operador de fotocopiadora em uma papelaria, precisa desesperadamente de trinta e oito reais para impressionar a garota dos seus sonhos, Sílvia, que mora no prédio em frente e trabalha como balconista em uma loja de artigos femininos. Ajudado por seu amigo Cardoso, e depois também pela colega de trabalho Marinês, André faz muitos planos para conseguir dinheiro. E todos dão certo. E é aí que seus problemas começam.

Autor do cartaz: Não identificado

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Segundo longa-metragem de Jorge Furtado, é um dos mais bem-sucedidos trabalhos do diretor. Com um roteiro ágil e muito bem construído, o filme tem em seu excelente elenco, liderado pela dupla Lázaro Ramos e Leandra Leal, um de seus principais trunfos. À época do lançamento, foi recebido com críticas positivas e teve boa repercussão de público.

 

 

 

“Trajetórias do Cinema Moderno”, o livro seminal de Enéas de Souza

 

Enéas de Souza tinha apenas 27 anos de idade quando publicou “Trajetórias do Cinema Moderno”, em 1965.

O livro é um marco da crítica cinematográfica brasileira, e reúne análises profundas e eruditas sobre a obra de diretores como Alain Resnais, Joseph Losey, Jean-Luc Godard, Michelangelo Antonioni, Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Walter Hugo Khouri, Howard Hawks e Orson Welles, entre outros. O jovem crítico aliou a sua formação em filosofia às ideias da teoria do autor propagadas pelos críticos de cinema franceses, em especial aqueles reunidos em torno da revista “Cahiers du Cinéma”, para produzir ensaios críticos de grande densidade teórica e analítica.

A obra de Enéas de Souza ocupa um lugar pioneiro na bibliografia de cinema no Brasil, antecipando outros livros hoje clássicos como “Brasil em Tempo de Cinema” (1967), de Jean-Claude Bernardet, e “Cinema: Trajetória no Subdesenvolvimento” (1973), de Paulo Emílio Sales Gomes.

“Trajetórias do Cinema Moderno” teve uma segunda edição em 1974 e, mais tarde, em 2007, uma terceira edição, complementada por outros textos esparsos do autor. Embora estejam esgotadas, elas podem ser encontradas em sebos com relativa facilidade, e também estão disponíveis para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

Aos 83 anos, Enéas de Souza segue em plena atividade e atualmente é um dos editores da revista “Teorema – Crítica de Cinema”.

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “Manhã Transfigurada”

 

(2008, ficção, 102 minutos), de Sérgio de Assis Brasil. Com Manuela do Monte, Rafael Sieg, Denise Copetti e Paulo Saldanha.

Sinopse: Final do século XIX. Época em que as grandes propriedades são sinônimo de poder e a Igreja representa a autoridade moral. Nesse cenário, a jovem Camila é levada a casar-se com um rico estancieiro para resgatar a posição social de sua família. Porém, na noite de núpcias seu marido descobre que ela não é virgem. Aprisionada com sua dama de companhia enquanto aguarda a anulação do casamento, e recebendo apenas as visitas do padre e do sacristão, Camila envolve-se em um triângulo amoroso marcado por paixões que desafiam fé e razão.

Autor do cartaz: Índio Sam
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Longa-metragem inteiramente produzido na cidade de Santa Maria, a partir do romance homônimo do escritor Luiz Antonio de Assis Brasil. Captado em digital, o filme teve uma produção conturbada e só foi chegar aos cinemas após a morte de seu diretor, Sérgio de Assis Brasil, falecido em dezembro de 2007. Trata-se de um esforço de realização único, que conseguiu viabilizar um melodrama de época no interior do Rio Grande do Sul, com uma equipe majoritariamente local.

 

 

 

 

“Agosto 13, Sexta-feira”, um raro longa-metragem gaúcho da década de 50

 

A reduzida produção cinematográfica no Rio Grande do Sul na década de 50, que costuma ser associada à realização de “Vento Norte” (1951), de Salomão Scliar – o primeiro longa-metragem de ficção sonoro produzido no Estado – teve um outro capítulo importante, ainda que menos lembrado.

Dirigido pelo italiano Camilo Tebaldi (também referido em algumas fontes como Camillo Tedaldi), “Agosto 13, Sexta-feira” (1955) reuniu em seu elenco um conhecido grupo de astros da rádio local (Pinguinho, Amilton Fernandes, Walter Broda, Lina Ferreira, Vânia Elizabeth…) numa comédia de erros criminal envolvendo dois assassinatos e um assalto a uma joalheria. A narrativa enxuta, com apenas 74 minutos de duração, acompanha os fatos das nove ao meio-dia, mostrando as jóias circulando por mãos inocentes até terminarem na mesa de um delegado que esclarece as diversas casualidades e coincidências em torno dos episódios. Os créditos de apresentação destacavam a informação de que “todos os personagens do filme enfrentaram pela primeira vez a câmera cinematográfica”.

Em seu dicionário dedicado a profissionais estrangeiros no cinema brasileiro, Jurandyr Noronha diz que Camilo Tebaldi veio para o Brasil em 1952 e se estabeleceu em Porto Alegre, onde realizou documentários para a Secretaria da Agricultura. O diretor trabalhou com Manoel Tomazzoni, produtor e fotógrafo de documentários no Rio Grande do Sul, e retornou para a Itália no começo dos anos 60. O motivo, segundo a imprensa da época, seria o fracasso de “Agosto 13, Sexta-feira”. Em sua edição de 19 de maio de 1956, o semanário paulista “Cine Repórter” noticiou que o diretor, “desgostoso com o insucesso de sua realização, retirou-se para São Paulo, de onde pretende voltar à Itália, sua pátria”.

Em agosto de 2004, a extinta TVCOM (1995-2015) exibiu “Agosto 13, Sexta-feira”, numa programação que incluiu outros longas gaúchos (as sessões aconteciam aos sábados, às 22h30, com reprise aos domingos, às 14h30).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “O Caso do Homem Errado”

 

(2017, documentário, 77 minutos), de Camila de Moraes.

Sinopse: A trágica história de Júlio César de Melo Pinto, operário negro que foi executado em Porto Alegre pela Polícia Militar, nos anos 1980. O episódio é resgatado através de depoimentos como o de Ronaldo Bernardi, o fotógrafo que fez as imagens que tornaram o caso conhecido, o da viúva do operário, Juçara Pinto, e de nomes respeitados da luta pelos direitos humanos e do movimento negro no Brasil.

Autor do cartaz: Leo Guterres e Marcelo Porto Sperb
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Um documentário urgente, cuja atualidade fica ainda mais evidenciada diante dos trágicos acontecimentos recentes de violência associada ao racismo, no Brasil e nos Estados Unidos. É o segundo longa-metragem brasileiro dirigido por uma mulher negra a ter lançamento comercial no país, após “Amor Maldito” (1984), de Adélia Sampaio.

 

 

 

 

Há 60 anos, o primeiro festival de cinema de Porto Alegre


Muito antes da criação do Festival de Gramado, cuja primeira edição ocorreu em 1973, Porto Alegre promoveu, em julho de 1960, um grande evento dedicado ao cinema brasileiro. O I Festival de Cinema Nacional de Porto Alegre mobilizou a atenção do público e da imprensa por trazer à capital gaúcha celebridades como Grande Otelo, Oscarito, Odete Lara, Ruth de Souza, Maria Della Costa e Eva Wilma, entre outros.

O festival aconteceu no Cine Teatro Rex e, segundo relatos de jornais da época, na segunda noite do evento, após a exibição do filme “Duas Histórias – Cacareco Vem Aí” (1960), de Carlos Manga, Oscarito subiu ao palco e afirmou que ele e Grande Otelo “nasceram para trabalhar juntos”, fazendo ainda um pequeno show de mímica que divertiu a plateia. No dia seguinte, o grande cômico participou de um churrasco na sede campestre da Varig, na zona sul, ao qual foi usando trajes gauchescos, e Odete Lara “tomou cachaça numa guampa”.

A presença de artistas conhecidos na cidade provocou cenas de histeria explícita, como reportaram os jornais locais: “O entusiasmo era tanto que a polícia teve de efetuar um verdadeiro serviço de salvamento para retirar as crianças do meio da multidão que rodeava o ônibus onde se encontravam os artistas”.

O I Festival de Cinema Nacional de Porto Alegre foi prestigiado pelos principais mandatários da época. O prefeito Loureiro da Silva entregou a chave da cidade no aeroporto à atriz Maria Della Costa e, entusiasmado, chegou a afirmar que o evento “superou os festivais de Cannes e de Punta del Este, porque, além de ser de cinema brasileiro, foi realizado em Porto Alegre”.

Já o jovem governador Leonel Brizola entregou aos artistas convidados medalhas comemorativas confeccionadas especialmente para a ocasião. As medalhas traziam forjada a seguinte frase: “A indústria nacional do cinema será o elo que unirá todos os brasileiros”.

* Informações retiradas da coluna Almanaque Gaúcho, assinada por Ricardo Chaves no jornal “Zero Hora”, na edição de 2 de julho de 2014.

 

 

 

 

 

 

Cartaz: “Valsa para Bruno Stein”

 

(2007, ficção, 95 minutos), de Paulo Nascimento. Com Walmor Chagas, Ingra Liberato, Aracy Esteves e Leonardo Machado.


Sinopse: Bruno Stein e sua família moram em uma casa na Serra Gaúcha onde fabricam tijolos artesanalmente. Suas vidas mudam com a chegada de um forasteiro que desperta uma série de sentimentos no patriarca, já caminhando para o fim da vida.

Autor do cartaz: Não identificado

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Accorde Filmes

Adaptação do romance homônimo de Charles Kiefer, este é o segundo longa-metragem dirigido por Paulo Nascimento, um dos mais profícuos cineastas surgidos no Rio Grande do Sul nas duas últimas décadas. Kikito de melhor atriz para Ingra Liberato no Festival de Gramado.

 

 

 

 

Um drama policial ambientado na Porto Alegre do início da década de 70

 

Dirigido por Américo Pini, o drama policial “Um Crime no… Verão” (1971) é uma das raridades desconhecidas do cinema gaúcho. Com uma trama ambientada em Porto Alegre no início dos anos 70, em plena ditadura militar, o filme gira em torno de uma família vítima de um plano de extorsão: bandidos envenenam a esposa e os três filhos de um rico empresário, que precisa correr contra o tempo para conseguir entregar a eles a quantia exigida em troca de um soro capaz de salvar a vida de sua família.

Há muito tempo fora de circulação (os negativos estariam depositados na Cinemateca Brasileira, não se sabe em quais condições), “Um Crime no… Verão” não foi bem recebido na época de seu lançamento. Embora seja um precursor do cinema urbano no Rio Grande do Sul, o filme provocou pouca atenção e acabou praticamente esquecido. Em seu livro “Cinema Gaúcho: Uma Breve História” (1986), o crítico Tuio Becker diz que “essa história de um envenenamento coletivo vale a pena ser ignorada”, reconhecendo ainda que “a vocação para o policial definitivamente não encontra eco no cinema gaúcho”.

O diretor uruguaio Américo Pini havia trabalhado anteriormente como fotógrafo em “O Gigante de Pedra” (1953), de Walter Hugo Khouri, e “Coração de Luto” (1967), de Eduardo Llorente, o longa de estreia de Teixeirinha, experiência que iniciou sua relação com o cinema gaúcho. Os diálogos do filme foram assinados pelo dramaturgo Ivo Bender. Aníbal Damasceno Ferreira, mais tarde professor de cinema na PUCRS, assumiu a função de assistente de direção.

A figura mais conhecida no elenco de “Um Crime no… Verão” é a atriz e apresentadora Márcia de Windsor, na época muito popular por sua participação como jurada em programas de televisão no centro do País. Mas chama a atenção nos créditos o nome de Ana Amélia Lemos, que abandonaria a carreira artística pelo jornalismo e, posteriormente seria eleita senadora pelo Rio Grande do Sul.

“Um Crime no… Verão” (1971, ficção, colorido, 90 minutos), de Américo Pini. Com Márcia de Windsor, Aníbal Pardeiro, Jaime Renato Souza, Álvaro Alves Pereira e César Magno.

 

 

 

 

 

Cartaz: “A Morte Não Marca Tempo”

 

(1973, ficção, 92 minutos), de Pereira Dias. Com José Mendes, Darcy Fagundes, Alice Aveiro e Carlos Castilhos.


Sinopse: O filho de um importante fazendeiro de uma extensa região de fazendas e quintas é encontrado morto, próximo a um penhasco. O caso é um mistério na cidade e a polícia resolve jogar a culpa da morte em um perigoso bandido que ronda a região. Porém, a própria força policial teme capturar o criminoso.

Autor do cartaz: Não identificado

Técnica: Ilustração

Sexto longa-metragem dirigido por Pereira Dias, mais conhecido por sua parceria com a dupla Teixeirinha e Mary Terezinha, com quem realizaria seis filmes. Aqui, Dias dirige novamente o astro da música regionalista José Mendes, após os sucessos de bilheteria de “Pára, Pedro!” (1969) e “Não Aperta, Aparício!” (1970).

 

 

 

 

Cinema 1 – Sala Vogue (1959-1994), o “cinema de arte” da avenida Independência

 

Inaugurado em 1959, na avenida Independência, quase na esquina com a Rua Garibaldi, o Cinema Vogue tinha como público alvo os moradores da região, “de bom nível econômico e cultural, morador da avenida Independência, reduto da aristocracia porto-alegrense desde o início do século XX”.

Por esta razão, o Vogue ficaria conhecido como a sala do cinema europeu, lançando com exclusividade na cidade títulos de grandes diretores, com atenção especial aos franceses (Claude Chabrol, François Truffaut, Jean-Luc Godard, Alain Resnais), mas também espanhóis (Carlos Saura, Luis Buñuel) e italianos (Federico Fellini, Mario Monicelli, Irmãos Taviani, Michelangelo Antonioni). Um dos tantos filmes marcantes na história da sala, atraindo multidões ao longo de meses, foi o suíço “Jonas que Terá 25 Anos no Ano 2000”, de Alain Tanner. Os japoneses Akira Kurosawa e Nagisa Oshima também eram presença constante.

Em 1984, após uma reforma, passa a chamar-se Cinema 1 – Sala Vogue, assinando contrato com a empresa francesa Gaumont, com foco no melhor do cinema europeu produzido na época. O filme que reinaugurou o espaço foi “Fanny e Alexander”, de Ingmar Bergman, dando início a uma nova fase de grande atividade, com o público formando longas filas para ver filmes como “E la Nave Va”, de Federico Fellini, ou “Hannah e Suas Irmãs”, de Woody Allen.

Para o crítico de cinema Luiz César Cozzatti, o Vogue era “o útero de felicidade dos críticos cinematográficos e cinéfilos porto-alegrenses em geral”.
* Informações retiradas do livro “The End – Cinemas de Calçada em Porto Alegre (1990-2005)”, de Cristiano Zanella, disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.

 
Cartaz: “Enquanto a Noite Não Chega”
(2010, ficção, 70 minutos), de Beto Souza. Com Miguel Ramos, Clênia Teixeira e Sirmar Antunes.

Sinopse: Uma cidade em ruínas tem apenas três habitantes: Eleutério e Conceição, um casal de idosos, e Teodoro, o coveiro. O único motivo que prende Teodoro ao lugar é a promessa feita de que enterraria o último morador da cidade. Conceição e Eleutério não saem de casa há bastante tempo, vivendo com um punhado de mantimentos e as lembranças dos filhos e de antigos habitantes, relembradas através de filmes antigos. Um dia, Teodoro não chega para jantar com o casal. Preocupados, eles decidem ir até o cemitério para descobrir o que pode ter acontecido com o amigo.

Autor do cartaz: Não identificado

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Beto Souza

Adaptação da novela homônima de Josué Guimarães, o quinto longa-metragem dirigido por Beto Souza participou da competição oficial do Festival de Gramado em 2010, mas nunca teve lançamento comercial em cinemas. Em função disso, passados 10 anos de sua primeira exibição, segue praticamente desconhecido pelo público.

 

 

 

Walt Disney, o gênio da animação, em Porto Alegre

 

Walt Disney (1901-1966), o gênio da animação, está na lista dos grandes nomes do cinema mundial que passaram por Porto Alegre. Disney esteve na cidade no dia 8 de setembro de 1941, em função de uma escala de seu vôo entre o Rio de Janeiro e Buenos Aires. A visita-relâmpago do criador de Mickey Mouse e Pateta à capital gaúcha durou apenas meia hora, mas teve ampla cobertura da imprensa. No aeroporto, Disney foi recebido por Erico Verissimo, a quem já havia encontrado há alguns meses nos Estados Unidos, durante uma viagem do escritor ao país (experiência registrada por Erico no livro “Gato Preto em Campo de Neve”, lançado em 1941).

O autor de “O Tempo e o Vento” era um entusiasta do trabalho de Disney, e em 1934, antes do impacto provocado por “Branca de Neve e os Sete Anões” (1937), primeiro longa-metragem de animação dos Estúdios Disney, escreveu sobre os seus curtas na “Revista do Globo”: “Walt Disney merece um lugarzinho entre os grandes homens do nosso tempo (…) conseguiu realizar o grande sonho das crianças e dos poetas: fazer as gravuras coloridas dos livros de história de fadas ganharem movimento e começarem a viver suas aventuras sem precisar mais das palavras do texto, (…) para mim, particularmente, programa com Mickey Mouse é programa que declaro bom sem olhar para o que vem depois…” (na época, os curtas animados da Disney costumavam anteceder a exibição dos filmes de longa-metragem nos cinemas).

A viagem de Walt Disney ao Brasil, que posteriormente renderia o filme “Alô, Amigos” (1942), estrelado pelo personagem Zé Carioca, fazia parte do programa de boa vizinhança entre os Estados Unidos e a América Latina, cujo objetivo era estreitar os laços geopolíticos com os países do continente durante a Segunda Guerra Mundial.

* Na foto, Walt Disney (à esquerda), ao lado do jornalista Antônio Onofre da Silveira (centro) e do escritor Erico Verissimo (à direita).

 

 

 

 

 

Cartaz: “Central”

 

(2016, documentário, 79 minutos), de Tatiana Sager e Renato Dornelles.

 

Sinopse: Um retrato sobre a dura realidade do Presídio Central, em Porto Alegre. Notícia constante nas mídias nacional e internacional por suas condições degradantes, o Central foi considerado a pior prisão do Brasil e definido como “A Masmorra do Século 21” pela CPI do Sistema Carcerário.

Autor do cartaz: Fabrício Menna Barreto

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Longa-metragem documental sobre o maior presídio do Rio Grande do Sul, dirigido a quatro mãos por Tatiana Sager e Renato Dornelles, e que toma como ponto de partida o livro de Dornelles, “Falange Gaúcha”. Através de depoimentos de apenados, policiais militares e visitantes, além de análises de autoridades, são caracterizados o cotidiano e as precárias condições do presídio, que já foi alvo de denúncias à OEA por violação dos direitos humanos.

 

 

 

Os 20 anos do 3º Congresso Brasileiro de Cinema em Porto Alegre


Este mês de junho marca a passagem dos 20 anos do 3º Congresso Brasileiro de Cinema em Porto Alegre. Não seria exagero afirmar que foi o evento mais importante já realizado pela classe, cujos diferentes agentes voltavam a se reunir depois de 47 anos em um congresso no qual se definiriam as políticas públicas para o setor audiovisual nos próximos anos, entre elas a criação da Ancine, a Agência Nacional do Cinema. Tendo como anfitriã a Fundacine RS, o 3º CBC aconteceu entre os dias 28 de junho e 1º de julho de 2000, no Hotel Continental, reunindo cerca de 150 pessoas de todo o país em debates intensos e produtivos, com oito grupos de trabalho, três seminários e três plenárias.

Em artigo publicado em setembro de 2010 na “Revista de Cinema”, Gustavo Dahl, que foi o primeiro presidente do CBC e o primeiro diretor-presidente da Ancine, entre 2001 e 2006, escreveu a respeito daquele encontro histórico: “O eixo Rio-Porto Alegre funciona no Brasil desde Getúlio e a Revolução de 30. Funcionou de novo. A necessidade de articulação política e institucional era tão grande que à convocação atenderam 44 entidades, do sindicato dos distribuidores majors à ABD, dos produtores aos pesquisadores, dos noviços aos cardeais. A capacidade de trabalho e de síntese de Giba Assis Brasil, combinada com aquela de sistematização de Aurelino Machado, produziu um impressionante relatório final, com 69 pontos. Estava tudo lá. Seria didático reexaminá-los para ver o que se conseguiu, o que perimiu e o que permanece. Durante os três dias do 3º Congresso, tinham todos a sensação de que pelas assembleias cheias de fervor soprava o vento da história do cinema brasileiro.”

Também foi no 3º Congresso Brasileiro de Cinema que Manoel Rangel, então à frente da Associação Brasileira de Documentaristas (ABD), despontou como liderança nacional do setor. Rangel tinha então 29 anos e liderava uma entidade historicamente ligada à esquerda – que brigava, sobretudo, por espaço para os curtas-metragens. Anos depois, Rangel seria nomeado diretor-presidente da Ancine, realizando uma gestão histórica.

Infelizmente, as conquistas alcançadas pelo cinema brasileiro a partir de 2000 estão hoje ameaçadas por uma política de desmonte, que ignora a força econômica do setor e a crescente repercussão internacional dos nossos filmes.

 

 

 

 

Cartaz: “O Mentiroso”
(1988, ficção, 95 minutos), de Werner Schünemann. Com Angel Palomero, Lila Vieira, Paulo José, Patrícia Travassos e Xala Felippi.
Sinopse: Uma comédia de estrada que satiriza a tradição dos “road movies”. Quatro pessoas (entre elas, um mentiroso), por acaso, caem na estrada. Sem dinheiro e sem convicções, fazem de uma pequena viagem de fim-de-semana o princípio de suas possibilidades de libertação.

Autor do cartaz: Washington Carvalho

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Terceiro – e, até o momento, último – longa-metragem dirigido pelo também ator Werner Schünemann, após “Coisa na Roda” (1982, realizado em Super-8) e “Me Beija” (1984). Prêmios de melhor filme (júri oficial e júri popular), melhor direção, melhor ator (Angel Palomero) e melhor atriz coadjuvante (Xala Felippi) no Festival de Brasília.

Uma pioneira história do cinema gaúcho

Lançado em 1986 pela editora Movimento, o livro “Cinema Gaúcho – Uma Breve História”, de Tuio Becker, foi o primeiro esforço de apresentar uma visão panorâmica da produção cinematográfica no Rio Grande do Sul, abordada em seus diferentes momentos e manifestações.

Um dos mais respeitados e atuantes críticos de cinema do Rio Grande Sul, Tuio Becker (1943-2008) decidiu organizar todo o material que escrevera anteriormente sobre cinema gaúcho, acrescendo revisões e novos textos, a fim de trazer maior organicidade e fluência ao conjunto final.

Com 112 páginas, divididas em cinco blocos (Os Longas, Os Curtas, O Super-8, Os Anos 80 e Apêndice), o livro inclui muitas fotografias (algumas bastante raras, de filmes perdidos) e tem a capa assinada pelo artista Mário Röhnelt. Embora esteja fora de circulação há muitos anos, o pioneiro livro de Tuio Becker permanece como uma fonte de consulta importante aos interessados pelo tema, e pode ser encontrado com certa facilidade em sebos.

Na apresentação de “Cinema Gaúcho – Uma Breve História”, escreveu seu autor: “No inverno de 1972, durante uma reunião em casa de amigos, Antônio Augusto Fagundes me entregou o roteiro de “O Negrinho do Pastoreio” dizendo: ‘O papel do filho do estancieiro, aquele menino ruim, é teu’. Meu envolvimento mais direto com o cinema gaúcho começou por aí. O que ocorreu a partir de então, durante e após as filmagens, é uma longa história onde o raciocínio crítico entra em choque com a paixão pelo cinema, produzindo resultados nem sempre tranquilos. Fazer cinema e pensar cinema no Rio Grande do Sul é um exercício difícil, quase impossível”.

Cartaz: “Tolerância”

(2000, ficção, 110 minutos), de Carlos Gerbase. Com Maitê Proença, Roberto Bomtempo, Ana Maria Mainieri, Maria Ribeiro e Nelson Diniz.


Sinopse: Márcia e Júlio, depois de 20 anos de casados e com uma filha adolescente, se veem obrigados a confrontar suas civilizadas teorias sobre o sexo e a política com a realidade, descobrindo que nem o mundo, nem eles mesmos, ainda são suficientemente civilizados.

Autor do cartaz: Não identificado

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Lançado há 20 anos, “Tolerância” foi um dos três projetos vencedores do primeiro Prêmio RGE/Governo do Estado RS, que teria mais duas edições e viabilizou a realização de nove longas-metragens gaúchos na década passada. Recebido com boas críticas à época do seu lançamento, “Tolerância” conquistou o prêmio do público no 24º Festival de Havana.

 
O reconhecimento internacional de “O Dia em que Dorival Encarou a Guarda”
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Em 2020, quando o Brasil volta a flertar com o autoritarismo e os episódios de violência contra a população negra se intensificam, o curta-metragem “O Dia em que Dorival Encarou a Guarda” (1986) ganha impressionante atualidade. Dirigido a quatro mãos por Jorge Furtado e José Pedro Goulart, esta adaptação de um trecho do romance “O Amor de Pedro por João” (1982), de Tabajara Ruas, é uma das grandes realizações do cinema gaúcho. Também foi a primeiro filme feito no Rio Grande do Sul a alcançar reconhecimento internacional, conquistando os prêmios de melhor curta-metragem nos festivais de Havana (Cuba) e de Huelva (Espanha), além de ser o principal vencedor em sua categoria na 14ª edição do Festival de Gramado, onde teve uma recepção consagradora. Em Havana, o prêmio de melhor curta foi entregue a Jorge Furtado e José Pedro Goulart pelo cineasta norte-americano Francis Ford Coppola. Em entrevista ao jornalista Marcelo Perrone para o jornal “Zero Hora” por ocasião dos 30 anos de lançamento do curta, em abril de 2016, Furtado relembrou a noite daquela histórica premiação: “Quando anunciaram o nome do Coppola para entregar o prêmio de melhor curta, o teatro Karl Marx, lotado com mais de 5 mil pessoas, veio abaixo. Até então, não se costumava dar prêmios aos curtas em Havana”.
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“O Dia em que Dorival Encarou a Guarda” foi viabilizado graças ao primeiro edital público de apoio à produção de curtas realizado no RS, lançado em outubro de 1985 pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul. O filme acompanha o presidiário Dorival (João Acaiabe, em atuação brilhante), que dentro de sua cela enfrenta a hierarquia militar para ter o simples direito de tomar um banho numa noite de calor extremo. Trata-se de uma subversiva ode à insubmissão, cuja inventiva montagem de Giba Assis Brasil incorpora trechos dos clássicos “King Kong” e “Casablanca”, trazendo um alívio cômico inesperado ao drama vivido pelo protagonista.
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À época de seu lançamento, o escritor Caio Fernando Abreu assim se referiu a “O Dia em que Dorival Encarou a Guarda”, em artigo publicado no jornal “O Estado de S. Paulo”: “Humor e violência cruzam-se em doses exatas, e o resultado são 14 minutos intensos de segurança e brilho”.
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Em 2019, “O Dia em que Dorival Encarou a Guarda” foi eleito um dos 100 melhores curtas brasileiros já realizados (ocupando a 20ª posição), em votação realizada pela Abraccine, a Associação Brasileira de Críticos de Cinema.
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A quem quiser rever ou descobrir esta pequena jóia do cinema gaúcho, a produtora Casa de Cinema disponibilizou gratuitamente um link para visionamento: https://vimeo.com/240817481
e o podcast: https://open.spotify.com/episode/6lS9YmUAO6Q2dAI2QT1c6I?si=4mPEgOVrTDGO_Lxh5aDleA
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* Na foto, o ator João Acaiabe como Dorival, e os diretores José Pedro Goulart e Jorge Furtado, ao lado do cineasta Francis Ford Coppola, recebendo o prêmio de melhor curta de ficção do 8º Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano, em Havana.
Cartaz: “Extremo Sul”
(2005, documentário, 92 minutos), de Monica Schmiedt e Sylvestre Campe.

Sinopse: Em março de 2003 cinco alpinistas montam um acampamento no extremo sul da Terra do Fogo, um dos locais mais inóspitos do planeta. Enfrentando o frio, a chuva constante, a neve e os ventos fortes, realizam uma expedição para escalar o Monte Sarmiento, uma montanha pouco explorada mas bastante conhecida pela sua beleza, isolamento e perigo.

Autor do cartaz: Tatiana Sperhacke
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Um dos três projetos vencedores da segunda edição do Prêmio RGE/Governo do Estado RS de Cinema, este documentário sobre a fracassada tentativa de escalada de uma montanha na Argentina por um grupo de alpinistas é considerado o primeiro longa-metragem sobre montanhismo realizado no Brasil. “Extremo Sul” foi o único longa dirigido por Monica Schmiedt, uma das mais importantes produtoras de cinema do RS. Monica faleceu precocemente, em março de 2016, às vésperas da estreia de “Prova de Coragem”, de Roberto Gervitz, sua última produção.

 

A criação do Instituto Estadual de Cinema

O Instituto Estadual de Cinema, mais conhecido como Iecine, foi criado pelo Governo do Estado em 22 de julho de 1986, com o objetivo de “incentivar e apoiar, de forma sistemática, a produção, distribuição e exibição cinematográfica no Estado”. O lançamento oficial da nova instituição ocorreu na abertura da Mostra Gaúcha no Festival de Gramado, no dia 21 de agosto de 1986.A criação do Iecine foi um importante passo no processo de consolidação institucional do setor cinematográfico no Rio Grande do Sul, centralizando as demandas da classe junto ao Governo do Estado. O primeiro diretor do Iecine foi Antônio Carlos Sena, nome indicado pela APTC-RS e pela Aprocinergs.

Um convênio com a APTC-RS permite disponibilizar câmeras, microfones, iluminação e mesa de montagem para captação de imagens e áudio. Os equipamentos estão disponíveis para a classe cinematográfica no Iecine, desde que o solicitante esteja cadastrado com sua entidade profissional. A instituição também organiza e promove cursos e oficinas de formação e atualização de mão-de-obra, realiza ações de incentivo à produção cinematográfica, por meio do Prêmio Iecine de Curta-Metragem, promove intercâmbios com outros países da América Latina, entre outras atividades.

Curiosamente, a criação do Iecine aconteceu no mesmo ano (1986) em que foi lançado o livro “Cinema Gaúcho – Uma Breve História”, de Tuio Becker, primeiro esforço de sistematizar a história da produção cinematográfica no Rio Grande do Sul desde os seus primórdios.

Neste momento, a direção do Iecine RS é ocupada pelo cineasta Zeca Brito.

Cartaz: “Concerto Campestre”

(2004, ficção, 100 minutos), de Henrique de Freitas Lima. Com Antonio Abujamra, Samara Felippo, Leonardo Vieira e Aracy Esteves.


Sinopse: O rico dono de uma charqueada apaixonado por música contrata um maestro para formar uma orquestra de câmara no interior do Rio Grande do Sul. Só que a chegada do regente mexe também com o coração de sua filha, Clara Victória.
Autor do cartaz: Agência ImagemTécnica: FotografiaCréditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Um dos três projetos vencedores da primeira edição do Prêmio RGE/Governo do Estado RS de Cinema, este é o terceiro longa-metragem assinado por Henrique de Freitas Lima. O diretor é um dos principais nomes ligados à vertente regionalista do cinema gaúcho, com predileção por dramas de época ambientados no interior do RS. Aqui, Freitas Lima adapta o romance homônimo do escritor Luiz Antonio de Assis Brasil.

O dia em que Ettore Scola visitou Porto Alegre

Em julho de 1996, a Coordenação de Cinema, Vídeo e Fotografia da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre (à época capitaneada por Bia Barcellos) realizou, em parceria com a produtora Casa de Cinema, o seminário “O Cinema do Fim ao Começo”. O evento teve como principal atração a presença do diretor Ettore Scola (1931-2016), grande mestre do cinema italiano, cujos filmes eram particularmente admirados pelo público porto-alegrense. Títulos como “Nós que Nos Amávamos Tanto”, “Um Dia Muito Especial”, “Feios, Sujos e Malvados”, “O Baile” e “Casanova e a Revolução” permaneceram durante meses em cartaz nos cinemas locais, e o anúncio de que seu autor estaria em carne e osso na cidade provocou alvoroço entre os cinéfilos.
Afinal, era a primeira vez que Porto Alegre recebia um cineasta europeu daquela estatura, admirado no mundo inteiro por sua filmografia radicalmente humanista. Scola foi convencido a vir à capital gaúcha graças a uma carta escrita por Giba Assis Brasil, um dos sócios da Casa de Cinema, enviada ao diretor em 9 de abril de 1996. Tocado pelas palavras apaixonadas de Giba, Scola disse que “não podia negar o convite depois de uma carta tão febril”. Três meses mais tarde, o grande diretor encarava uma exaustiva viagem transatlântica, desembarcando em Porto Alegre na companhia de sua esposa Gigliola.
Numa fria tarde de sábado, Scola falou para uma plateia lotada, no auditório da Assembleia Legislativa. Ao ser questionado sobre a crise das esquerdas e o fim das utopias, um dos temas de sua palestra, respondeu: “A esquerda não morre, a esquerda existia antes dos partidos, e continuará existindo depois. A esquerda é um modo de ser do homem, e faz parte da utopia. A utopia faz parte do homem e não acredito que possa acabar, justamente porque o homem não acaba”.
Nos anos seguintes, a Coordenação de Cinema, Vídeo e Fotografia da SMC realizaria outros seminários de cinema, em formato semelhante, sempre com a presença de convidados ilustres, já então na Usina do Gasômetro. A transcrição desses seminários, incluindo a fala de Ettore Scola, foi editada no livro “Cinema Falado – 5 Anos de Seminários de Cinema em Porto Alegre” (2001), disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
A íntegra da carta-convite enviada por Giba Assis Brasil a Ettore Scola pode ser acessada aqui: http://www.casacinepoa.com.br/o-blog/giba-assis-brasil/uma-carta-de-20-anos-atr%C3%A1s
* Na foto, Giba Assis Brasil (à esquerda), ao lado de Ettore Scola. Registro feito pela jornalista Maria do Rosário Caetano.
Cartaz: “Harmonia”
(2000, documentário, 90 minutos), de Jaime Lerner.
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Sinopse: A polêmica causada pela construção de uma pista de eventos no Parque da Harmonia coloca em lados opostos o movimento tradicionalista e os carnavalescos da cidade, trazendo à tona tensões culturais, raciais e políticas.
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Autor do cartaz: Rogério GrilhoTécnica: IlustraçãoCréditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀
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Lançado há 20 anos, este documentário em 16mm dirigido por Jaime Lerner foi o primeiro longa-metragem realizado com recursos do Fumproarte, o fundo municipal de apoio à produção artística criado em 1993 pela Prefeitura de Porto Alegre, que até então havia financiado somente curtas.

“Férias no Sul”, um longa rodado em Gramado na década de 60
A vocação cinematográfica de Gramado, hoje palco de um dos mais importantes festivais de cinema do País, tem origens remotas.
Em 1966, o diretor mato-grossense Reynaldo Paes de Barros filmou na serra gaúcha o longa “Férias no Sul”, com os atores David Cardoso e Elisabeth Hartmann no elenco. Embora a maior parte do filme tenha sido rodada em Blumenau e Balneário Camboriú, em Santa Catarina, esta obra pouco conhecida do cinema brasileiro também teve locações em Gramado, Canela e Caxias do Sul. O diretor do filme, Reynaldo Paes de Barros, havia estudado cinema na Califórnia e, de volta ao Brasil, fez a fotografia de “Menino de Engenho” (1965), de Walter Lima Jr., antes de lançar-se à direção com “Férias no Sul”. Considerado ousado pelo tratamento em relação ao comportamento sexual de seus personagens, o filme conta a história do carioca Celso (o quase estreante David Cardoso, que pouco tempo depois explodira como galã de produções eróticas na Boca do Lixo), um estudante de Economia que decide passar suas férias no sul, a convite de um amigo que vive em Blumenau. Lá, ele conhece a escritora carioca Isa (vivida pela atriz gaúcha Elisabeth Hartmann), uma mulher desquitada, de atitudes avançadas para a época, e a ingênua professora blumenauense Helga (a estreante Dagmar Heidrich, recentemente eleita Miss Blumenau), iniciando uma relação amorosa com ambas.
Lançado nos cinemas em 1967, “Férias no Sul” teve restrições da Censura Federal, sendo proibido para menores de 18 anos. O Banco de Dados da Cinemateca Brasileira informa que o filme sofreu cortes que suprimiram dos diálogos as seguintes expressões: “milico”, “puxar o saco deles”, “eles estão por cima”, “quem gosta de milico é fuzil”, “sacanear é a frase” e “um Presidente civil eleito pelo povo”.
Depois de “Férias no Sul”, Gramado serviria de locação para outros filmes, como “Gaudêncio, o Centauro dos Pampas” (1972), de Fernando Amaral, e “As Filhas do Fogo” (1979), de Walter Hugo Khouri.
* Um link de “Férias no Sul” está disponível no YouTube.
 
Cartaz: “Houve uma Vez Dois Verões”
(2002, ficção, 75 minutos), de Jorge Furtado. Com André Arteche, Ana Maria Mainieri, Pedro Furtado e Júlia Barth.
Sinopse: Chico, adolescente em férias na “maior e pior praia do mundo”, encontra Roza num fliperama e se apaixona. Transam na primeira noite, mas ela some. Ao lado de seu amigo Juca, Chico procura Roza pela praia, em vão. Só mais tarde, já de volta a Porto Alegre e às aulas de química orgânica, é que ele vai reencontrá-la. Chico quer conversar sobre “aquela noite”, mas Roza conta que está grávida. Até o próximo verão, ela ainda vai entrar e sair muitas vezes da vida dele.
Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
Primeiro longa-metragem dirigido por Jorge Furtado, após uma série de curtas de enorme repercussão, como “O Dia em que Dorival Encarou a Guarda” (1986), co-dirigido por José Pedro Goulart, e “Ilha das Flores” (1989). A tardia estreia de Furtado no longa deu-se, entre outras razões, pelo desmonte do cinema brasileiro no governo Collor, no início dos anos 90. Rodado em digital, o filme teve uma ótima carreira, e agradou sobretudo ao público jovem, seduzido por sua trama muito bem construída e pelo frescor de seu elenco.
Ricardo Hoeper, um rosto marcante do cinema gaúcho
Com seu rosto de traços fortes e angulosos, o ator Ricardo Hoeper foi uma presença frequente nos longas realizados no Rio Grande do Sul ao longo da década de 70.
Nascido em 1933, na cidade de Venâncio Aires, Hoeper trabalhou no rádio (como locutor e ator) e no teatro (onde participou de montagens de textos como “Entre Quatro Paredes”, de Jean-Paul Sartre, “A Morte do Caixeiro-Viajante”, de Arthur Miller, e “Hamlet”, de William Shakespeare). Sua estreia no cinema foi em “Ela Tornou-se Freira” (1972), produção de Teixeirinha, com quem voltaria a trabalhar outras duas vezes, em “Teixeirinha a 7 Provas” (1973) e “A Quadrilha do Perna Dura” (1976).
Sob a direção de Alberto Ruschel, contracenou com Débora Duarte em “Pontal da Solidão” (1974), filmado na praia de Torres. Também teve papéis de destaque no drama político “Um Homem Tem de Ser Morto” (1973), de David Quintans, e em “Os Mucker” (1978), de Jorge Bodansky e Wolf Gauer, premiado no Festival de Gramado.
A última atuação de Hoeper no cinema foi no longa-metragem em 16mm “Heimweh/Nostalgia”, de Sérgio Silva e Tuio Becker, lançado em 1990.
Ricardo Hoeper faleceu em 10 de março de 2001, na cidade de Gramado.
Os filhos do ator criaram uma página no Facebook para homenagear a memória do pai, e assim o descrevem: “Ricardo Hoeper foi locutor de rádio, ator de cinema e teatro. Gostava de filosofia, fazendo sua livre interpretação sobre as ideias de Nietzsche, Schopenhauer, Kant, e outros. Católico convicto – mas não praticante – adorava debater questões religiosas. Em meio a tudo isso, vez por outra filosofava, e lançava suas frases de efeito, que queria transformar em livro… mas não teve tempo.”
Filmografia de Ricardo Hoeper:
1972 – Ela Tornou-se Freira
1973 – Teixeirinha a 7 Provas
1973 – Um Homem Tem de Ser Morto
1973 – O Negrinho do Pastoreio
1974 – Pontal da Solidão
1976– A Quadrilha do Perna Dura
1978 – Os Mucker
1990 – Heimweh/Nostalgia
Cartaz: “Tinta Bruta”
(2018, ficção, 118 minutos), de Filipe Matzembacher e Marcio Reolon. Com Shico Menegat, Bruno Fernandes, Guega Peixoto e Sandra Dani.
Sinopse: Pedro é um jovem que tenta sobreviver em meio a um processo criminal, à partida da irmã e aos olhares que recebe sempre que sai na rua. Sob o codinome Garoto Neon, ele se apresenta no escuro do seu quarto para milhares de anônimos ao redor do mundo, pela internet. Com o corpo coberto de tinta, realiza performances eróticas na frente da webcam. Ao descobrir que outro rapaz de sua cidade está copiando sua técnica, Pedro decide ir atrás do mesmo.
Autor do cartaz: Silvo
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
Dirigido a quatro mãos pela dupla Filipe Matzembacher e Marcio Reolon, “Tinta Bruta” é o longa-metragem de maior repercussão internacional já realizado no Rio Grande do Sul. Vencedor do Teddy Award no Festival de Berlim em 2018, o que lhe garantiu distribuição comercial em diversos países, o filme se destaca pelo rigor de sua encenação e pela impressionante atuação de seu protagonista, o estreante Shico Menegat.

Carmen Miranda em Porto Alegre

No inverno de 1935, Carmen Miranda, então a artista mais famosa do país, veio a Porto Alegre para participar da festa de inauguração da Rádio Farroupilha, na noite de 24 de julho. A cantora e atriz desembarcou no dia anterior no Cais do Porto ao lado do cantor Mário Reis, outro grande ídolo da época, sendo recebida por uma multidão de fãs.Terceira emissora de rádio de Porto Alegre, anunciada como “a mais poderosa do Rio Grande do Sul”, os estúdios da Farroupilha foram instalados num casarão da rua Duque de Caxias, no alto do viaduto da Borges de Medeiros, ali permanecendo até 1954, quando a rádio foi incendiada durante uma manifestação popular após o suicídio de Getúlio Vargas.

Pesquisador da história do rádio no Rio Grande do Sul, Luiz Artur Ferraretto, professor da UFRGS, assim descreveu aquela noite memorável: “Uma fria noite de inverno. O público se aglomera em frente a um casarão da Duque de Caxias, número 1304, em pleno centro de Porto Alegre. Em torno do prédio de dois andares, cada um espera ver, nem que seja por breves instantes, na chegada ou na saída, dois dos mais importantes artistas da música brasileira, assunto, desde a véspera, das rodas de conversa da Rua da Praia, a principal da cidade. De fato, neste 24 de julho de 1935, repete-se o acontecido na tarde anterior, quando centenas de pessoas foram até o Cais do Porto, junto à estação flutuante do Condor Syndikat. De um hidroavião da empresa aérea alemã, desceram então Carmen Miranda, sem dúvida a maior cantora brasileira, e Mário Reis, um dos principais intérpretes da música de Noel Rosa. (…) Pelos corredores dentro do casarão nos altos do viaduto que corre perpendicular à avenida Borges de Medeiros, circula um orgulhoso Arnaldo Ballvé, ex-funcionário do Banco da Província do Rio Grande do Sul convertido em diretor da estação pelos laços de parentesco e amizade entre a sua família e a dos proprietários, a do general José Antônio Flores da Cunha, governador do estado. Junto ao estúdio, apenas convidados especiais a garantir certa feição de elite à PRH-2, primeira grande emissora de rádio do Sul do país. Na Duque e ao longo das quatro escadarias do viaduto, a multidão cresce na expectativa também de ouvir seus ídolos pelos alto-falantes colocados no lado de fora do prédio.”

​Seria improvável que naquele inverno de 1935 Carmen Miranda e Mário Reis tenham, em algum momento, descido as escadarias do viaduto da Borges e caminhado até a esquina da Demétrio Ribeiro para conhecer o imponente Cine-Theatro Capitólio, localizado a apenas uma quadra da Rádio Farroupilha?

* A foto registra o desembarque de Carmen Miranda e Mário Reis em Porto Alegre, no dia 23 de julho de 1935.

Cartaz: “Sobre Sete Ondas Verdes Espumantes”

(2013, documentário, 74 minutos), de Bruno Polidoro e Cacá Nazario.

Sinopse:  Santiago, Amsterdã, Berlim, Colônia, Paris, Londres, Porto Alegre, São Paulo. As cidades que testemunharam a vida breve do poeta, dramaturgo e escritor Caio Fernando Abreu (1948-1996) são revisitadas e recobertas agora de fragmentos de suas obras e lembranças de seus amigos, como Maria Adelaide Amaral e Adriana Calcanhotto.Autor do cartaz: Marina Polidoro

Técnica: Ilustração

Créditos da imagem: Acervo Besouro Filmes

Documentário sobre a trajetória do escritor Caio Fernando Abreu que recusa o tradicional formato de combinar imagens de arquivo e entrevistas. Ao invés disso, a dupla de diretores Bruno Polidoro e Cacá Nazario opta por uma aproximação mais ensaística do universo estético do escritor gaúcho, convocando uma série de pessoas importantes na vida de Caio para lerem trechos de suas obras.

A resistência do cinema gaúcho após o desmonte do governo do Collor em três longas
Em 1990, logo após a sua posse, Fernando Collor de Mello, o primeiro presidente levado ao poder por eleições diretas no Brasil após o Regime Militar, desferiu um duro golpe no cinema brasileiro. Ao suspender os mecanismos de incentivo ao setor e extinguir órgãos como a Embrafilme, o Concine e a Fundação do Cinema Brasileiro, Collor inviabilizou a produção cinematográfica no País. Um período sombrio, que destruiu vidas e carreiras de centenas de profissionais da área, muitos dos quais jamais conseguiram se recuperar.
Entre 1991 e 1995, somente duas produções brasileiras alcançaram mais de 500 mil espectadores nos cinemas, sendo que em 1992 um único longa nacional chegou às telas, “A Grande Arte”, de Walter Salles. A partir de 1992, o Festival de Gramado teve que se internacionalizar, tornando-se ibero-americano, pois não havia mais como viabilizar uma competição exclusiva de longas brasileiros, pela absoluta falta de títulos.
Ainda assim, o cinema gaúcho procurou reagir, lançando três longas entre 1990 e 1995: “Heimweh/Nostalgia” (1990), de Sérgio Silva e Tuio Becker (filmado e finalizado em 16mm), “Rocky & Hudson: Os Caubóis Gays” (1994), de Otto Guerra, e “Felicidade É…” (1995), reunião de quatro curtas dirigidos pelos gaúchos Jorge Furtado e José Pedro Goulart, e pelos paulistas José Roberto Torero e Cecílio Neto.
Foi uma forma criativa de resistir, seja recorrendo a uma bitola não profissional (como fizeram Sérgio Silva e Tuio Becker), seja produzindo longas episódicos. Com menos de uma hora de duração (para ser considerado longa um filme precisa ter pelo menos 70 minutos), Otto Guerra promoveu um lançamento comercial com tratamento de longa-metragem a seu “Rocky & Hudson: Os Caubóis Gays”, formado por duas histórias, “A Pistola Automática do Doutor Brain” e “Pé na Estrada”. Já “Felicidade É…” combinou os esforços de quatro produtoras (duas do Rio Grande do Sul e duas de São Paulo) para reunir quatro curtas em um projeto de longa coletivo, que seria premiado nos festivais de Brasília e Gramado em 1995. Os episódios eram “Bolo”, de José Roberto Torero, “Estrada”, de Jorge Furtado, “Cruz”, de Cecílio Neto”, e “Sonho”, de José Pedro Goulart.
* Nas fotos, em ordem, “Heimweh/Nostalgia”, de Sérgio Silva e Tuio Becker; “Rocky & Hudson: Os Caubóis Gays”, de Otto Guerra; “Estrada”, de Jorge Furtado, e “Sonho”, de José Pedro Goulart, episódios do longa “Felicidade É…”.
Cartaz: “Cidades Fantasmas”
(2017, documentário, 70 minutos), de Tyrell Spencer.

Sinopse:  Deserto chileno, Amazônia brasileira, Andes colombianos e Pampa argentino. Quatro destinos na América Latina, onde as ruínas e o silêncio são o plano de fundo da nossa jornada. Alguns de seus antigos moradores ainda guardam na memória o que viveram ali e, através de relatos mais intimistas, evocam lembranças de um passado que não querem esquecer.

Autor do cartaz: Clóvis Borba

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Longa de estreia de Tyrell Spencer, este documentário realizado pela produtora Casa de Cinema para o canal Globo News foi o grande vencedor do festival É Tudo Verdade em 2017. Com belíssima fotografia de Glauco Firpo, o filme conduz o espectador a uma viagem por lugares inusitados, que parecem ter sido criados pela ficção.

“Ventre Livre”, outro exemplo da resistência do cinema gaúcho na primeira metade da década de 90

Na postagem anterior, falamos sobre a resistência do cinema gaúcho nos primeiros anos da década de 90, através de três longas realizados no período de desmonte do setor pelo governo Collor, que inviabilizou a produção cinematográfica no País ao suspender mecanismos de incentivo e extinguir órgãos como a Embrafilme, o Concine e a Fundação do Cinema Brasileiro. Mas além de “Heimweh/Nostalgia” (1990), de Sérgio Silva e Tuio Becker (filmado e finalizado em 16mm), “Rocky & Hudson: Os Caubóis Gays”, de Otto Guerra, e “Felicidade É…” (1995), reunião de quatro curtas dirigidos por Jorge Furtado, José Pedro Goulart, José Roberto Torero e Cecílio Neto, outra produção muito importante daquele período deve ser destacada, o documentário de média-metragem “Ventre Livre”, de Ana Luiza Azevedo.Lançado em 1994, o filme aborda com contundência e lucidez a questão do aborto e dos direitos reprodutivos no Brasil, e foi financiado com recursos internacionais, a convite da Fundação MacArthur. Tanto pela importância de seu tema quanto pela qualidade de sua realização, “Ventre Livre” ocupa um lugar bastante significativo na história do nosso cinema. Exibido em diversos países e premiado em festivais como Gramado e Brasília, sua repercussão foi enorme. Trata-se de um documento revelador sobre a fragilidade da condição feminina em um país extremamente desigual, que denuncia fraturas sociais ainda hoje não resolvidas, passados 26 anos de sua realização.

Cartaz: “Mulher do Pai”
(2016, ficção, 94 minutos), de Cristiane Oliveira. Com Maria Galant, Marat Descartes e Verónica Perrotta.

Sinopse:  Ruben e Nalu moram no campo, perto da fronteira entre Brasil e Uruguai. Quando ele percebe que a filha, aos 16 anos, já é uma mulher, uma perturbadora proximidade surge entre os dois. O estranhamento inicial dá lugar ao ciúme quando Rosario, uma atraente uruguaia, ganha espaço na vida de ambos.

Autor do cartaz: Não identificado

Técnica: Fotografia

Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Longa de estreia de Cristiane Oliveira, realizado em regime de co-produção com o Uruguai, “Mulher do Pai” teve sua estreia mundial no Festival do Rio, em 2016, e em fevereiro de 2017 participou da seleção Generation no Festival de Berlim. Para contar esse drama intimista ambientado numa pequena cidade do interior, a diretora convocou uma equipe majoritariamente feminina para assumir funções-chave como a produção (Aletéia Selonk, Graziella Ferst e Gina O’Donnell), a fotografia (Heloísa Passos), a montagem (Tula Anagnostopoulos) e a direção de arte (Adriana Nascimento Borba).

A passagem de Michelangelo Antonioni pelo Festival de Gramado
Uma das consequências do processo de desmonte do cinema brasileiro após a eleição do presidente Fernando Collor de Mello, em 1989, foi a internacionalização do Festival de Gramado. A partir de 1992, o tradicional evento cinematográfico realizado na serra gaúcha tornou-se ibero-americano, pois não era mais possível organizar uma competição exclusiva de longas brasileiros, devido à carência de novos títulos. Filmes de países de língua espanhola, de Portugal, da França e da Itália passaram a fazer parte da mostra competitiva de Gramado, concorrendo entre si numa única disputa. E com isso, a presença de convidados estrangeiros no tapete vermelho também começou a ser frequente.
Em agosto de 1994, a grande atração do Festival de Gramado foi o diretor italiano Michelangelo Antonioni (1912-2007), autor de obras-primas como “A Noite”, “O Deserto Vermelho”, “Zabriskie Point” e “Profissão: Repórter”. Aos 82 anos de idade, e mesmo sofrendo as sequelas de um AVC, Antonioni foi convencido a vir a Gramado por um convite de seu amigo Walter Hugo Khouri. Era a sua primeira viagem ao Brasil, e até hoje a passagem do mestre italiano por Gramado é lembrada como um dos grandes momentos da história do festival. Acompanhado pela sua esposa Enrica, Antonioni recebeu um Kikito especial por sua carreira, numa sessão que exibiu um curta que ele havia dirigido sobre a Copa do Mundo na Itália, em 1990, e o clássico “A Noite” (1961), com Marcello Mastroianni e Jeanne Moreau.
*Nas fotos, Michelangelo Antonioni recebendo seu Kikito e ao lado do crítico de cinema Tuio Becker (1943-2008).
Cartaz:  “Dromedário no Asfalto”
(2014, ficção, 85 minutos), de Gilson Vargas. Com Marcos Contreras, Vanise Carneiro e Laura Schneider.
Sinopse:  Depois de perder a mãe, Pedro se sente devastado e determinado a conhecer a identidade de seu pai. A única informação que ele tem é que o homem partiu para o Uruguai para viver recluso.
Autor do cartaz: Leo Lage
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
A trajetória de um personagem em busca de reconexão com o seu passado é o ponto de partida para o longa de estreia de Gilson Vargas, um típico filme de estrada que tem na atuação de Marcos Contreras um de seus principais trunfos.
Cine Victoria, a sala das grandes filas no centro de Porto Alegre
Inaugurado em 4 de setembro de 1940, com o nome de Cinema Vera Cruz, na esquina da Avenida Borges de Medeiros com a Rua Andrade Neves, só em 1953 a elegante sala de 1100 lugares passaria a se chamar Cine Victoria. Entre os tradicionais cinemas de rua de Porto Alegre, foi o que teve uma das trajetórias mais longas, colecionando muitas histórias. Segunda sala de cinema da cidade instalada no pavimento de um prédio residencial (a primeira foi o Imperial, em 1931), o Vera Cruz abriu como “o mais moderno e confortável cinema da cidade” e foi o primeiro a ter todas as poltronas estofadas. O cinema exibia os filmes da produtora alemã UFA, o que provocaria a sua depredação, em gesto de repúdio ao avanço nazista durante a Segunda Guerra. Também foi a sala que estreou “Cidadão Kane” em 1942, com péssima recepção. Indignado com a reação negativa do público, seu proprietário teria jogado as latas do filme na calçada em protesto, recusando-se a continuar exibindo a obra-prima de Orson Welles, conforme relato de Susana Gastal no livro “Salas de Cinema: Cenários Porto-Alegrenses” (1999).
Porém, é como Cine Victoria que a sala iria conhecer seus anos de glória, entre meados dos anos 50 e o final da década de 70, concentrando multidões na esquina da Borges com a Andrade Neves, que se aglomeravam para assistir a produções como “La Violetera”, “Psicose”, “Tubarão” e tantos outros títulos de sucesso.
Em maio de 1999, após uma reforma que o descaracterizou completamente, o Victoria foi reinaugurado, agora transformado em duas salas menores. Assim se manteve até novembro de 2018, quando fecha suas portas, ao que tudo indica em caráter definitivo.
* Informações retiradas dos livros “The End – Cinemas de Calçada em Porto Alegre (1990-2005)”, de Cristiano Zanella, e “Salas de Cinema: Cenários Porto-Alegrenses”, de Susana Gastal, disponíveis para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
Cartaz: “Rocky e Hudson: Os Caubóis Gays”

(1994, animação, 63 minutos), de Otto Guerra.

Sinopse:  A dupla de caubóis gays Rocky e Hudson em duas histórias. Em “A Pistola Automática do Dr. Brain” um vilão cria uma pistola guiada por controle remoto, a fim de liquidar os heróis gays. Já “Pé na Estrada” é um falso “road movie” em que os heróis e seu fiel cavalo Silverado encontram a avó de Rocky, formando um quarteto que não vai perdoar nenhum clichê dos westerns que povoam a memória afetiva de várias gerações.

Autor do cartaz: Fábio Zimbres

Técnica: Ilustração

Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio

Adaptação cinematográfica das histórias da dupla de caubóis gays criada por Adão Iturrusgarai, este filme marcou a estreia do animador Otto Guerra no longa-metragem (ainda que sua duração seja menor do que os 70 minutos exigidos para que um filme seja considerado um longa). Um projeto ousado e pioneiro, realizado no período de terra arrasada do cinema brasileiro, logo após a eleição de Fernando Collor de Mello para a presidência.

O protagonismo trans no curta “Au Revoir Shirlei”
“Au Revoir Shirlei”, curta-metragem dirigido por Gilberto Perin em 1991, é o primeiro filme protagonizado por uma atriz trans no Rio Grande do Sul (embora na época essa expressão ainda não fosse utilizada). Rebecca McDonald, artista bastante conhecida no circuito gay de Porto Alegre por suas incendiárias performances no palco, interpreta a personagem central do curta, a travesti Shirlei, que tem seu sonho de viver na França bruscamente interrompido durante um voo para Paris.
O diretor Gilberto Perin, mais conhecido por sua atuação na televisão, fala sobre a experiência, que mobilizou uma grande equipe na sua realização, viabilizada com poucos recursos: “O curta foi criado e rodado em 1991, auge de mais uma crise do cinema brasileiro. Usamos somente cinco latas de negativo 35mm. Várias cenas foram rodadas uma única vez, inclusive o emblemático beijo entre Rebecca e o ator Angel Palomero, que interpretava seu noivo – talvez um dos únicos beijos até aquele ano entre um ator e um transformista. Aliás, esse curta foi – pelo menos no Rio Grande do Sul e quem sabe no Brasil – o primeiro em que transformistas interpretaram transformistas. Ou seja, não foram escalados atores que interpretariam um personagem transformista. Tudo aconteceu muito antes das discussões e bandeiras que surgiram anos depois. Tem um strip-tease masculino, que também não se via nas telas do cinema brasileiro. Os “clubes de mulheres” ainda não tinham entrado na moda.”
“Au Revoir Shirlei” participou de diversos festivais no Brasil e no exterior (Sidney, Nova York, Havana), e também foi exibido na televisão (TV Manchete e TV Cultura de São Paulo). Sobre a passagem pelo Festival de Havana, Gilberto Perin recorda que a exibição do filme colocou Rebecca McDonald na capa do jornal oficial do Comitê Central do Partido Comunista de Cuba, país que historicamente perseguia homossexuais.
Rebecca McDonald morreu em março de 2009, com apenas 42 anos de idade.
Cartaz: “Au Revoir Shirlei”
(1991, ficção, 8 minutos), de Gilberto Perin. Com Rebecca McDonald, Angel Palomero e Everton Barreto.
Sinopse: A travesti Shirlei é uma das pessoas que sonham em viver na França mas são obrigadas a voltar ao Brasil. A bordo do avião em direção a Paris, ela relembra fragmentos de sua vida.
Autor do cartaz: Paulo Lilja
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
Primeiro filme protagonizado por uma atriz trans no Rio Grande do Sul, Rebecca McDonald, figura muito admirada no circuito gay porto-alegrense por suas performances em bares e boates. É a única investida no cinema de Gilberto Perin, mais conhecido por sua atuação na televisão. Montagem de Giba Assis Brasil e roteiro co-assinado por Alice Urbim junto com o diretor. Na época, um período de crise aguda no cinema brasileiro, eram relativamente raros os curtas que conseguiam produzir cartazes de divulgação.
“Pontal da Solidão”, o longa de Alberto Ruschel filmado em Torres
Natural de Estrela, o gaúcho Alberto Ruschel (1918-1996) foi um dos atores mais requisitados do cinema brasileiro, especialmente após o sucesso internacional de “O Cangaceiro” (1953), de Lima Barreto, premiado no Festival de Cannes.
No começo da década de 70, Ruschel retornou ao seu estado de origem para lançar-se à direção, realizando na cidade de Torres o longa “Pontal da Solidão” (1974), protagonizado por ele próprio e pela atriz Deborah Duarte. Drama psicológico com atmosfera fantástica, ambientado numa comunidade de pescadores, essa única incursão de Ruschel como diretor adapta um conto de Lima Barreto sobre uma jovem que é acolhida por um velho marujo após ser violentada. Em seu livro “Cinema Gaúcho: Uma Breve História” (1986), o crítico Tuio Becker destaca as qualidades do filme, elogiando “a magnífica fotografia de Mário Carneiro” e a capacidade de Ruschel para criar “sequências compactas de extrema beleza visual e força narrativa”.
Exibido fora de concurso na segunda edição do Festival de Gramado, em 1974, “Pontal da Solidão” não teve a repercussão esperada por Alberto Ruschel, que nunca mais aventurou-se na direção. Este seu esforço solitário permanece quase desconhecido, e é um dos tantos longas produzidos no Rio Grande do Sul que necessita ser urgentemente restaurado, para que possa circular novamente e se torne acessível às novas gerações.
Cartaz: “Nós Duas Descendo a Escada”
(2015, ficção, 98 minutos), de Fabiano de Souza. Com Carina Dias, Miriã Possani, Diones Camargo e Rafael Tombini.
Sinopse:
Adri é uma jovem recém formada na faculdade de artes que divide seu tempo entre o único amigo, o emprego e a terapia. Quebrando a monotonia de sua vida, um dia ela conhece Mona, uma arquiteta bem relacionada e com dinheiro. Na escada de um prédio em Porto Alegre, nasce uma paixão entre duas pessoas muito diferentes.
Autor do cartaz: André Pires
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
Segundo longa-metragem dirigido por Fabiano de Souza, realizado de forma totalmente independente, com filmagens somente nos finais de semana, uma vez ao mês, ao longo de nove meses. Uma história de amor louco entre duas mulheres, com cenas de sexo intensas e um olhar generoso sobre a cidade de Porto Alegre e suas ruas.
Cine Cacique (1957-1994), o gigante da Rua da Praia
A inauguração do luxuoso Cine Cacique, em setembro de 1957, foi o grande acontecimento cinematográfico do ano na capital gaúcha, conforme relatos da imprensa na época. Localizado no número 943 da Rua dos Andradas, com mais de 1500 lugares, o Cacique era a maior sala da cidade, e durante muito tempo também a mais rentável. Em seu livro “Salas de Cinema: Cenários Porto-Alegrenses” (1999), a jornalista e pesquisadora Susana Gastal descreve o impacto provocado pela abertura daquele novo cinema, “o gigante da cidade”, na vida cultural de Porto Alegre: “O Cacique anuncia muitas novidades. Ele teria ar-condicionado, com refrigeração e calefação, poltronas numeradas no mezanino, maior lotação com visão perfeita, maior tela de projeção, maior distância entre as poltronas totalmente estofadas, corredores com até 2,5 metros de largura, três projetores, bilheterias abertas desde as 9 horas, sessões contínuas a partir das 14 horas, moderna e luxuosa confeitaria, elevando Porto Alegre ao nível cinematográfico das grandes capitais da América. A sofisticação da casa apresenta um requinte extra: nas paredes laterais, murais assinados pelo artista Glauco Rodrigues”. Susana Gastal recupera ainda em seu livro as palavras do jornalista, escritor e crítico de cinema José Onofre (1942-2009) sobre a nova sala: “Fazia falta, na cidade, uma casa dessa envergadura, onde tudo transpira luxo, conforto, bem-estar. Tudo ali é belo, até os painéis de Glauco Rodrigues”.
Ao longo de toda a década de 80, o Cacique ainda manteve sua importância na cinelândia local, atraindo um público expressivo em lançamentos de filmes como “O Homem Elefante”, “Pixote, a Lei do Mais Fraco”, “E.T. – O Extraterrestre”, “Hair”, “O Enigma do Outro Mundo”, “A Marca da Pantera”, “Reds”,“Laços de Ternura”, entre tantos outros.
A partir do começo dos anos 90, o processo de decadência será irreversível, e o Cacique fecha suas portas em julho de 1994. Atualmente, o prédio abriga uma unidade do supermercado Zaffari, e no local há um pequeno memorial sobre o antigo cinema que durante mais de três décadas anos foi um orgulho dos cinéfilos porto-alegrenses.
* O livro “Salas de Cinema: Cenários Porto-Alegrenses” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
Cartaz: “Eles Vieram e Roubaram sua Alma”
(2016, ficção, 77 minutos), de Daniel de Bem. Com Filipe Rossato, Hiozer da Silva, Renato Paredes, Fernanda Feltes, Michele Dallas, Cris Eifler e Daniel de Bem.
Sinopse:
Com uma velha câmera VHS e a ajuda de um amigo que o apoia incondicionalmente, Mateus registra todos os tipos de imagens para um filme caseiro. Com seus 20 e poucos anos e vivendo em um subúrbio industrial, Mateus tenta encontrar alguma ligação entre as coisas que ele filma e as pessoas em sua vida. Um pequeno conto de amizade, impregnado por uma obsessão por registrar imagens.
Autor do cartaz: André Medeiros, sobre obra de Gabriel Pessoto
Técnica: Pintura
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
Longa-metragem independente dirigido por Daniel de Bem, até hoje inédito nos cinemas ou mesmo no streaming. Ex-aluno do Curso de Realização Audiovisual da Unisinos, o jovem diretor realizou esse seu primeiro longa de forma totalmente colaborativa. Após as filmagens, conseguiu finalizá-lo com recursos de um edital específico de finalização do FAC RS. Exibido em festivais importantes, como o Olhar de Cinema, em Curitiba (onde recebeu o prêmio de Contribuição Artística e Menção Especial do Júri), e o Festival de Brasília, “Eles Vieram e Roubaram sua Alma” teve apenas duas sessões em Porto Alegre, uma na Sala P. F. Gastal (em dezembro de 2016) e outra na Cinemateca Capitólio (em julho de 2017). Um filme a descobrir.
Uma diva italiana no Festival de Gramado
A internacionalização do Festival de Gramado, forçada pela crise sofrida pelo cinema brasileiro com a chegada de Fernando Collor de Mello à presidência em 1990, fez com que ao longo daquela década algumas grandes personalidades do cinema mundial circulassem pela serra gaúcha.
Uma das visitas mais lembradas é a da atriz italiana Gina Lollobrigida, que recebeu um Kikito especial por sua carreira em agosto de 1995, na 23ª edição do festival. Nascida em 1927, na pequena Subiaco, a atriz começou sua carreira no cinema italiano, mas sua extraordinária beleza logo chamará a atenção dos produtores americanos, que a lançariam como “a mais bela mulher do mundo” (título de um dos filmes que estrelou, em 1955).
Durante toda a década de 50 e meados dos 60, Lollobrigida brilhou em produções de enorme sucesso como “Quando Explodem as Paixões”, “Trapézio”, “Salomão e a Rainha de Sabá”, “O Corcunda de Notre-Dame” e “Quando Setembro Vier”, na companhia dos principais galãs da época (Rock Hudson, Burt Lancaster, Tony Curtis, Frank Sinatra, Sean Connery).
Quando veio a Gramado, Gina Lollobrigida (que acaba de completar 93 anos de idade e vive em Roma) já estava afastada do cinema, mas mantinha intacta a aura de grande diva. Chamou a atenção por sua simpatia e disponibilidade para atender aos fãs, muitos dos quais ainda guardavam na memória de sua infância ou juventude a imagem da atriz como a trapezista Lola do clássico “Trapézio” (1956), voando pelos ares no Circo de Inverno, em Paris, ao lado de Burt Lancaster e Tony Curtis.
* Nas fotos, imagens de Gina Lollobrigida em Gramado, e nos filmes “Salomão e a Rainha de Sabá” e “Trapézio”.
Cartaz: “Desvios”
(2016, ficção, 93 minutos), de Pedro Guindani. Com Rafael Mentges, Fernanda Menezes, Cassiano Ranzolin e Eduardo Steinmetz.
Sinopse:
Daniel, um jovem corretor de valores, dá um grande golpe em sua empresa de investimentos, fazendo-a comprar 15 milhões em ações de uma empresa fantasma. Romano, seu primo policial, fica encarregado de obter-lhe um passaporte falso para a fuga do país, e recomenda que Daniel se esconda por alguns dias em um apartamento do centro da cidade, “até a poeira baixar”. Mas a poeira nunca baixa, e Daniel vai se deixando consumir pela espera, pela prisão que se impôs e pelo medo de falhar em sua ambiciosa empreitada.
Autor do cartaz: Leo Lage
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
O primeiro longa-metragem de Pedro Guindani é um drama de suspense psicológico sobre homem que entra em crise após cometer um crime. O clima claustrofóbico e a tensão crescente mantêm o interesse do espectador, bem como a atuação segura do protagonista Rafael Mentges. A arte do cartaz é assinada por Leo Lage (@leolage.art), atualmente um dos designers mais requisitados pelo cinema gaúcho para a criação de seus cartazes.
“O Crime dos Banhados”, um longa perdido realizado em Pelotas
Na década de 10 do século passado, a cidade de Pelotas foi um importante centro de produção cinematográfica, graças ao trabalho do pioneiro Francisco Santos (1873-1937). Português natural da cidade do Porto, Santos chegou ao Brasil em 1903, integrando o elenco de uma companhia de teatro. Decidido a permanecer no Brasil, acaba criando a sua própria companhia teatral, com a qual viaja pelo país entre 1909 e 1912. Durante uma turnê no Rio Grande do Sul, resolve fixar residência em Pelotas e começa e dedicar-se ao cinema, fundando a produtora Fábrica Guarany (durante muito tempo chamada de Guarany Films, informação corrigida pelo pesquisador Glênio Póvoas em artigo publicado em 2009 no livro “Cinema Gaúcho: Diversidade e Inovações”). Além de produzir cinejornais e curtas, entre eles o célebre “Os Óculos do Vovô” (1913), a mais antiga obra de ficção brasileira preservada, Francisco Santos tem entre seus principais feitos a realização do longa-metragem “O Crime dos Banhados” (1914).
Uma produção ambiciosa, inspirada em acontecimentos reais, “O Crime dos Banhados” levou para as telas um polêmico episódio da crônica policial da época: o assassinato de uma família em uma fazenda no município de Rio Grande, motivado por questões políticas. O pesquisador Hernani Heffner descreve o filme no verbete que dedica a Santos na “Enciclopédia do Cinema Brasileiro” (2000): “Aparentemente com quase duas horas de duração em sua versão final, mescla filmagens em locação com elementos típicos da romanesca oitocentista, cercando a produção de inúmeros cuidados artísticos, como viragens (colorização artificial das cenas) e caracterização apurada. O sucesso é monumental, permitindo à Guarany elevar seu capital para a espantosa cifra de 1 mil contos de réis.”
Infelizmente perdido, “O Crime dos Banhados” tinha em seu elenco a participação dos atores Manoel Pêra e Abel Pêra (pai e tio da atriz Marília Pêra), também nascidos em Portugal, assim como o diretor Francisco Santos. Por seu pioneirismo, pelos esforços envolvidos na sua produção e por sua ampla repercussão de público, “O Crime dos Banhados” deve ser reconhecido como um dos filmes mais importantes da história do cinema gaúcho.
Cartaz: “A Filha de Iemanjá”
(1981, ficção, 108 minutos), de Milton Barragan. Com Teixeirinha, Mary Terezinha, Gaúcho Alegre e Vânia Elizabeth.
Sinopse:
Após a morte de sua esposa, o cantor Teixeirinha viaja para o litoral em busca de paz e descanso da rotina pesada. Lá, se apaixona por uma mulher misteriosa que conheceu na praia, mas não imagina que ela esteja envolvida com uma gangue de traficantes de drogas.
Autor do cartaz: Mascarenhas
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Brasileira
Último filme protagonizado por Teixeirinha e Mary Terezinha, dirigido por Milton Barragan, habitual colaborador da popular dupla, a quem dirigiu em outros quatro filmes. Dos 12 longas de Teixeirinha, foi o único a contar com distribuição da Embrafilme. Apesar disso, o filme naufragou nas bilheterias e encerrou de forma melancólica uma carreira cinematográfica marcada por grandes sucessos.
A descoberta de “Os Óculos do Vovô”
Na postagem anterior da série “Histórias do Cinema Gaúcho”, sobre o longa-metragem “O Crime dos Banhados”, de Francisco Santos, citamos rapidamente o curta “Os Óculos do Vovô”, também realizado por Santos na cidade de Pelotas, em 1913.
O mais antigo filme brasileiro de ficção preservado, “Os Óculos do Vovô” foi descoberto em 1973, pelo pesquisador gaúcho Antônio Jesus Pfeil, conforme relata a neta de Francisco Santos, Yolanda Lhullier dos Santos, no livro que dedicou ao avô, “Francisco Santos: Pioneiro no Cinema do Brasil” (1996), escrito em parceria com Pedro Henrique Caldas. Os rolos de nitrato do filme foram encontrados por acaso, em um baú, na casa da mãe de Yolanda. Pfeil teria encaminhado então o material para a Cinemateca Brasileira, onde foi restaurado (outra pesquisadora, Maria Rita Galvão, afirma que a restauração foi feita na Cinemateca do MAM, no Rio de Janeiro). Embora só cinco minutos de filme tenham sobrevivido, esta comédia sobre um menino travesso que pinta os óculos do avô, para que ele pense que está cego, preserva a sua graça e surpreende pela qualidade de sua encenação e domínio da montagem, numa época em que o cinema ainda estabelecia as bases de sua linguagem.
Em votação realizada pelos sócios da Associação Brasileira de Críticos de Cinema, “Os Óculos do Vovô” ficou na 53ª posição entre os 100 mais importantes curtas realizados no Brasil. A professora, pesquisadora e crítica de cinema Ivonete Pinto dedicou um artigo ao filme, publicado no livro “Curta Brasileiro: 100 Filmes Essenciais”, lançado em 2019. Em seu texto, ela detalha o intrincado processo de recuperação do enredo do filme, que envolveu até mesmo o crítico Paulo Emilio Sales Gomes: “Paulo Emilio teve acesso a um registro de jornal com a sinopse do filme e, examinando reproduções de fotogramas do curta feitas nos anos 1950, concluiu que ele deveria ter 15 minutos, pois havia 16 quadros divididos em duas partes. Portanto, há muito enredo perdido. (…) Com um agenciamento do espaço bastante moderno para a época, há relações de simetria entre os personagens que entravam e saíam do quadro, uma nítida coerência interna e, afinal, um expressivo domínio da decupagem e da montagem”.
Em 2013, para marcar o aniversário de 100 anos de lançamento de “Os Óculos do Vovô”, o Curso de Cinema da Universidade de Pelotas produziu o documentário “As Memórias do Vovô”, dirigido por Cíntia Langie, no qual foram recriadas as sequências perdidas do filme.
Cartaz: “A Cabeça de Gumercindo Saraiva”
(2018, ficção, 93 minutos), de Tabajara Ruas. Com Leonardo Machado, Murilo Rosa, Sirmar Antunes e Allan Souza Lima.
Sinopse:
Em 1895, no final da Revolução Federalista, o capitão rebelde Francisco Saraiva e cinco cavaleiros cruzam o sul do Brasil em uma exasperante caçada para resgatar a cabeça de Gumercindo Saraiva, cortada pelos legalistas e levada à capital pelo major Ramiro de Oliveira e dois ajudantes.
Autor do cartaz: Não identificado
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Produtora Walper Ruas
Filme mais recente de Tabajara Ruas, protagonizado pelo ator Leonardo Machado (1976-2018), em um de seus últimos trabalhos. Adaptação do romance homônimo de Ruas (publicado em 1997), autor que se divide entre a literatura e o cinema e tem predileção por narrativas históricas.
A vida extraordinária de Francisco Santos (parte 1)
Seguimos hoje com a série de publicações dedicadas a Francisco Santos (1873-1937), pioneiro do cinema gaúcho, diretor do longa “O Crime dos Banhados” (1914) e do curta “Os Óculos do Vovô” (1913), temas de nossas duas últimas postagens. A trajetória de Santos, responsável por transformar a cidade de Pelotas em um pólo de produção cinematográfica no país durante a primeira década do século passado, não pode ser resumida em um único post e merece ser desdobrada.
Natural da cidade do Porto, em Portugal, Francisco Santos nasceu em uma família tradicional. Seus pais eram advogados muito bem relacionados (a mãe de Francisco, Urbana, foi a primeira mulher a formar-se em advocacia em Portugal), a ponto de terem como padrinho de batismo de seu primogênito o célebre escritor Camilo Castelo Branco. Após a morte do pai, a mãe casou-se com um diplomata, o que iria azedar as relações familiares. Ainda adolescente, Francisco não aceita a imposição do padrasto para cursar Direito e decide fugir de casa com seu irmão caçula, Henrique. Logo em seguida, o jovem começa a trabalhar como ajudante de um fotógrafo e, pouco tempo depois, na redação do jornal de um tio. A atuação como jornalista leva Santos a acompanhar muito de perto a cena cultural portuguesa, despertando seu interesse pelo teatro. Em 1896, ele já frequenta os palcos de Lisboa, integrando o elenco da companhia teatral de Salvador Marques. Na mesma época, inicia seu relacionamento com a atriz Adelina Nobre, com que irá se casar. Juntos, Francisco e Adelina são contratados por algumas das companhias teatrais mais importantes da época, conforme registros da imprensa portuguesa: “Para o Teatro do Príncipe Real foram escriturados os artistas Adelina Santos e Francisco Santos, que fizeram parte da Companhia do Teatro de D. Maria nas últimas épocas”.
Paralelamente à sua trajetória como ator, o jovem Francisco Santos entusiasma-se pela descoberta do cinematógrafo Lumière. Adquire um projetor e uma câmera Pathé, e começa uma nova fase de sua carreira, que abordaremos em nossa próxima postagem.
* Informações retiradas do livro “Francisco Santos: Pioneiro no Cinema do Brasil” (1996), de Yolanda Lhullier dos Santos e Pedro Henrique Caldas, disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
Cartaz: “Verdes Anos”
(1984, ficção, 91 minutos), de Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil. Com Werner Schünemann, Luciene Adami, Márcia do Canto, Marcos Breda, Xala Felippi, Marta Biavaschi e Sérgio Lulkin.
Sinopse:
Três dias na vida de uma turma de colégio, em 1972. Nando namora Soninha, que dá bola pra todo mundo. Robertão apresenta o baile de escolha da Rainha. Teco se interessa por Rita. Dudu edita um jornalzinho de fofocas. Pedro é o goleiro do time da aula, e está apaixonado pela professora. Quanto tempo se leva para passar da adolescência à maturidade? Um fim de semana, alguns anos ou a vida inteira?
Autor do cartaz: Paulo Baldo
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
Para a crítica de cinema Andrea Ormond, “Verdes Anos” é “o melhor filme sobre jovens já feito no cinema brasileiro”. Este clássico do cinema local assinalou o momento de profissionalização da dupla de diretores, egressos do movimento Super-8, transformando-se em uma obra de referência para toda uma geração. Em 2016, a Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre lançou, em parceria com a Editora da UFRGS, o livro “Verdes Anos: Memórias de um Filme e de uma Geração”, da historiadora Alice Dubina Trusz, que inaugurou a linha editorial da Cinemateca Capitólio.
A vida extraordinária de Francisco Santos (parte 2)
Dando continuidade à série de publicações dedicadas a Francisco Santos (1873-1937), chegamos ao momento da biografia do diretor de “Os Óculos do Vovô” em que este, já estabelecido como ator de teatro em Portugal, começa a se interessar pela atividade cinematográfica. Depois de adquirir equipamentos de projeção e filmagem, o jovem Francisco percorre várias províncias portuguesas e também viaja pela Espanha e pelo norte da África, fazendo exibições de seu “cinema ambulante” e produzindo cinejornais. Paralelamente a seu interesse pelo cinema, surge a oportunidade de realizar uma turnê pelo Brasil – então um mercado promissor para os artistas portugueses – como integrante do elenco da companhia do Teatro do Príncipe Real. Francisco e a esposa Adelina chegam a Belém no início de 1903 e depois de uma série de espetáculos na capital paraense viajam para Manaus, onde se apresentam no imponente Teatro Amazonas. Mas o casal de atores logo irá se separar. Na mesma época, Santos conhece o também português Francisco Xavier, seu grande amigo e futuro sócio, e decide permanecer no Brasil.
Ao longo dos próximos anos, já casado com Maria do Carmo Rabello, sua segunda esposa, percorre o país em turnês teatrais e cria sua própria trupe, a Grande Companhia Dramática Francisco Santos. Em 1909, a companhia de Santos chega ao Rio Grande do Sul, para apresentações em Porto Alegre, Rio Grande e Pelotas. A boa acolhida em Pelotas deixa uma profunda impressão em Santos e a insistência da esposa, cansada das constantes e exaustivas viagens pelo país, fazem com que o casal decida estabelecer-se definitivamente na cidade.
A prosperidade econômica de Pelotas e sua efervescente vida cultural estimulam Santos a dar um passo ousado em sua carreira. Ele abandona a atividade teatral e funda, com o sócio Francisco Xavier, a pioneira Fábrica Guarany, inaugurada em 1912, com o objetivo de produzir “fitas cinematográficas” de todo o tipo, de peças publicitárias a coberturas de eventos (festas, partidas de futebol, desfiles carnavalescos), de cinejornais a obras de ficção.
O entusiasmo pelo novo empreendimento levará Santos a se arriscar a voos mais altos, como a produção de um longa-metragem inspirado no romance “Amor de Perdição”, de seu padrinho Camilo Castelo Branco. História que abordaremos em nossa próxima publicação.
(na foto, imagem do prédio da Fábrica Guarany em Pelotas)
* Informações retiradas do livro “Francisco Santos: Pioneiro no Cinema do Brasil” (1996), de Yolanda Lhullier dos Santos e Pedro Henrique Caldas, disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
Cartaz: “Em Teu Nome”
(2009, ficção, 100 minutos), de Paulo Nascimento. Leonardo Machado, Fernanda Moro, Nelson Diniz e César Troncoso.
Sinopse:
No início dos anos 70, o Brasil vive o endurecimento da ditadura militar. A sociedade se organizava e resistia das mais variadas maneiras. Alguns grupos políticos optaram pela luta armada para enfrentar o regime, assim como Boni (Leonardo Machado), um estudante de engenharia de origem humilde, que carrega dúvidas e medos a respeito de sua escolha. Ele teme pela família, pela namorada e pelo futuro, que parece mais incerto a cada dia. Como tantos outros, é preso, torturado e banido do país ao ser trocado por um embaixador suíço no chamado Grupo dos 70.
Autor do cartaz: Cleiton Ferraz
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Produtora Accorde Filmes
Terceiro longa realizado por Paulo Nascimento, um dos mais atuantes diretores do Rio Grande do Sul. Baseado na história real de João Carlos Bona Garcia, o filme conquistou os prêmios de melhor diretor, melhor ator, melhor trilha sonora e o Prêmio Especial do Júri no Festival de Gramado em 2009. É o grande momento da carreira cinematográfica do ator Leonardo Machado, morto precocemente em 2019.
A vida extraordinária de Francisco Santos (parte 3)
Hoje encerramos a série de postagens sobre o pioneiro do cinema gaúcho Francisco Santos. Estamos em 1913 e a Fábrica Guarany, a produtora de “fitas cinematográficas” inaugurada em Pelotas no ano anterior por Santos, está em plena atividade.
As filmagens de eventos e os cinejornais são bem recebidos pelos espectadores e logo ele e seu sócio Francisco Xavier se lançam à produção de longas. O projeto de levar às telas o romance “Amor de Perdição”, de Camilo Castelo Branco, seu padrinho de batismo, chega a ser iniciado, mas nunca será concluído. No entanto, outros dois longas serão realizados por Santos, “O Marido Fera” (1913) e “O Crime dos Banhados” (1914), bem como o curta “Os Óculos do Vovô” (1913), em que Santos também atua, interpretando o papel do avô.
Na detalhada pesquisa que fez em jornais da época, Glênio Póvoas conseguiu estabelecer a filmografia mais completa da Fábrica Guarany levantada até hoje, identificando um total de 41 títulos (a relação dos filmes está no artigo “Confusões, Entraves, Desafios na História da Fábrica Guarany”, publicado por Póvoas no livro “Cinema Gaúcho: Diversidade e Inovações”). Desses, apenas dois sobreviveram, “Santa Maria Atualidades” (1913) e “Os Óculos do Vovô”, o mais antigo filme brasileiro de ficção preservado.
Apesar da intensa atividade durante os anos de 1913 e 1914, a Fábrica Guarany encerraria suas atividades logo após o lançamento do longa “O Crime dos Banhados”. Embora se especule que o motivo pelo qual Santos abandonou o cinema teria sido a repercussão negativa do filme entre figuras poderosas da região de Pelotas (“O Crime dos Banhados” recriava o assassinato real de uma família devido a desavenças políticas), a razão mais provável para a interrupção das atividades da Fábrica Guarany é a eclosão da Primeira Guerra Mundial em 1914, fato que provocará a suspensão da importação de filme virgem da Europa.
Santos passa então a se dedicar à tipografia, à exibição cinematográfica e ao teatro. Com seu sócio Francisco Xavier constrói salas de cinema em Pelotas, entre elas o Apolo (em 1925) e o Capitólio (em 1928), bem como o luxuoso Theatro Guarany, inaugurado em abril de 1921. Segundo seus biógrafos, o Theatro Guarany é “o maior e melhor palco que Pelotas possui, e a obra que melhor representa o caráter arrojado, empreendedor e algo delirante de Francisco Santos”.
Francisco Santos morreu em 1937, aos 64 anos de idade. Seu legado e sua memória, no entanto, permanecem vivos.
(Nas fotos, Francisco Santos, à direita, com seu sócio Francisco Xavier, o Theatro Guarany em Pelotas, e dois fotogramas do curta “Os Óculos do Vovô”)
* Informações retiradas dos livros “Francisco Santos: Pioneiro no Cinema do Brasil” (1996), de Yolanda Lhullier dos Santos e Pedro Henrique Caldas, e “Cinema Gaúcho: Diversidades e Inovações” (2009), organizado por Cristiane Freitas Gutfreind e Carlos Gerbase, ambos disponíveis para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
“O Cárcere e a Rua” (2004, documentário, 80 minutos), de Liliana Sulzbach.
Sinopse:
Cláudia, presidiária mais antiga e respeitada da Penitenciária Madre Pelletier, deve deixar o cárcere em breve. Assim como Betânia, que vai para o regime semiaberto. Já Daniela, recém chegada à prisão, aguarda seu julgamento. Enquanto Daniela busca proteção na cadeia, Cláudia e Betânia vão enfrentar as incertezas de quem volta para a rua.
Autor do cartaz: Raffa Braga
Técnica: Fotografia e ilustração
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
Longa de estreia de Liliana Sulzbach, diretora que vinha de uma premiada trajetória no formato curta-metragem. Além de ser um retrato tocante sobre o sistema carcerário no Brasil, o filme propõe uma reflexão sobre o que significa adaptar-se a uma nova vida, ao acompanhar a trajetória de três mulheres flagradas em diferentes momentos de sua existência. Prêmio de melhor documentário no Festival de Gramado em 2004.
Central, o cinema das elites durante os anos 20 e 30
Na década de 20 do século passado, Porto Alegre contava com cerca de 172 mil habitantes e 17 salas de cinema. Entre elas, destacava-se o Central, com seus 1351 lugares, cuja inauguração, em 5 de março de 1921, introduziu o hábito das sessões vespertinas regulares e passou a exigir um novo padrão de comportamento para o público porto-alegrense. Seus proprietários, os irmãos Pasqual, Francisco e Salvador Sirângelo, decidem transformar seu elegante café Gioconda, localizado na esquina da Rua dos Andradas com a General Câmara, em uma sala de cinema dirigida à elite local, exigindo até mesmo trajes específicos para seus frequentadores, incluindo o uso de gravata para homens. O fato foi saudado pela imprensa da época, que afirmou ser o Central um local capaz de “fazer jus a uma plateia seleta”, tornando-se “o rendez-vous mais elegante do set porto-alegrense”. Em seu livro “Salas de Cinema: Cenários Porto-Alegrenses” (1999), Susana Gastal assim descreve a novidade: “O Central exige que o público masculino use gravata para frequentá-lo, o que de início causa alguns transtornos. Como a norma é mantida, o público se adapta, porque os proprietários são de opinião que os frequentadores devem estar vestidos de maneira condizente com o espetáculo. Assim, o Central manterá ao longo das décadas de 20 e 30, a fama de ser ‘o cinema das elites’”.
Na metade da década de 20, o Central passa por reformas, recebendo palco e estrutura cênica, diminuindo sua capacidade para 922 lugares, tornando-se conhecido também por sua excelente orquestra, que muitas vezes superaria a qualidade dos filmes. O compositor Radamés Gnatalli foi um dos músicos a passar pela famosa orquestra do Central.
Depois de permanecer durante anos como “o leader dos cinemas da capital”, o Central fecha suas portas em 1960, e seu prédio será demolido.
* Informações retiradas do livro “Salas de Cinema: Cenários Porto-Alegrenses” (1999), de Susana Gastal, disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
Cartaz: “Irmã”
(2020, ficção, 88 minutos), de Luciana Mazeto e Vinícius Lopes. Com Maria Galant, Anaís Grala Wegner, Felipe Kannenberg e Marina Mendo.
Sinopse:
A doença grave da mãe leva duas irmãs adolescentes a saírem em uma viagem pelo interior do Rio Grande do Sul em busca do pai. Sua jornada será marcada por fantasmas, superpoderes e dinossauros.
Autor do cartaz: Leo Lage e Martina Medeiros Nickel
Técnica: Ilustração
Créditos da imagem: Acervo Produtora Pátio Vazio
Selecionado para a seção Generation do Festival de Berlim, “Irmã” foi o primeiro longa gaúcho a estrear neste atípico ano de 2020, atropelado pela pandemia do novo coronavírus. Com o título internacional de “Sisters in the End of the World”, o filme da dupla Luciana Mazeto e Vinícius Lopes teve sua première mundial na capital alemã no dia 26 de fevereiro último, em sessão acompanhada por vários integrantes de sua equipe. Desde então, o lançamento comercial de “Irmã” no Brasil vem sendo aguardado com enorme expectativa.
Duas publicações pioneiras sobre o cinema gaúcho (parte 1)
Fundada em maio de 1985, a APTC-RS, a Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do Rio Grande do Sul esteve à frente de duas publicações pioneiras, que foram as primeiras tentativas de promover uma catalogação da produção local durante a década de 80: “Cinema Gaúcho – Anos 80” (1985) e “Cinema Gaúcho Anos 80 – Um Olhar Sobre a Década” (1991). Hoje, resgatamos a primeira delas.
“Cinema Gaúcho – Anos 80” acompanhava a primeira mostra de filmes gaúchos realizada no Estado, a “Retrospectiva Cinema Gaúcho”, que aconteceu entre os dias 16 de setembro e 6 de outubro de 1985, na Casa de Cultura Mário Quintana. O catálogo, com 40 páginas, foi organizado por Giba Assis Brasil e João Guilherme Reis e Silva e teve uma tiragem de mil exemplares. Restrita à produção dos anos 80 (ao contrário da mostra, que foi bem mais abrangente), a publicação inclui 70 títulos, com sinopse e ficha técnica dos filmes, além de muitas fotos, todas em preto e branco. No texto de apresentação do catálogo, os editores destacam que são “filmes que espelham com bastante clareza as diferentes tendências surgidas no cinema dos anos 80, em termos de formatos (do Super 8 ao vídeo) e temáticos”. E chamam a atenção para o pioneirismo da iniciativa: “Com este catálogo, pela primeira vez o cinema gaúcho mais recente tem a oportunidade de ser colocado fora das telas, de maneira organizada e com informações úteis para os que gostam de cinema e para os profissionais do setor”.
O catálogo “Cinema Gaúcho – Anos 80” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
Cartaz: “Ponto Zero”
(2015, ficção, 94 minutos), de José Pedro Goulart. Com Sandro Aliprandi, Patrícia Selonk, Eucir de Souza e Heinz Limaverde.
Sinopse:
Ênio, um menino de 14 anos, é capturado em uma claustrofóbica teia familiar que lhe toma a alma e lhe detém o desejo. Ao tentar escapar, ele enfrenta uma noite tempestuosa que o fará mergulhar no imprevisível, no fantástico e no aleatório.
Autor do cartaz: José Pedro Goulart e Samir Machado
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Cinemateca Capitólio
O aguardado longa de estreia de José Pedro Goulart, cineasta que após uma impactante contribuição no formato curta-metragem – tendo assinado o clássico “O Dia em que Dorival Encarou a Guarda” (1986), co-dirigido por Jorge Furtado –, iria se dedicar à publicidade. “Ponto Zero” estreou na mostra competitiva do Festival de Gramado em 2015, e se destaca pela criação de um crescente clima claustrofóbico, para o qual muito colaboram a trilha sonora de Leo Henkin e a fotografia de Rodrigo Graciosa.
Duas publicações pioneiras sobre o cinema gaúcho (parte 2)
Fundada em maio de 1985, a Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do Rio Grande do Sul esteve à frente de duas publicações que são esforços pioneiros na tentativa de promover uma catalogação da produção local durante a década de 80. Na postagem anterior, falamos sobre a primeira delas, “Cinema Gaúcho – Anos 80”, lançada em 1985. Hoje, apresentamos o catálogo “Cinema Gaúcho Anos 80 – Um Olhar Sobre a Década” (1991), editado através de uma parceria entre a APTC e a então recém criada Coordenação de Cinema, Vídeo e Fotografia da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre.
Em formato de revista, com 28 páginas, o catálogo lista 98 filmes, e inclui todas as produções gaúchas de cinema filmadas e finalizadas em 35mm ou 16mm entre os anos de 1980 e 1990. Também foram incluídos todos os filmes realizados na bitola Super-8 que tenham recebido prêmios em festivais. Cada título é acompanhado por sinopse e ficha técnica, e parte deles também por fotos. A capa traz uma imagem do curta-metragem “Vicious” (1988), de Rogério Ferrari. Segundo os editores, no texto de apresentação do catálogo, a publicação constitui num esforço para resgatar uma história que “precisa começar a ser contada”, reconhecendo que “por enquanto, nada mais significativo para contá-la do que os filmes presentes nestas páginas”.
Com uma tiragem de dois mil exemplares, o catálogo “Cinema Gaúcho Anos 80 – Um Olhar Sobre a Década” logo tornou-se uma obra de referência fundamental para pesquisadores da área. Hoje um autêntico item de colecionador, com sorte ainda pode ser encontrado em algum sebo da cidade.
* O catálogo “Cinema Gaúcho Anos 80 – Um Olhar Sobre a Década” está disponível para consulta na biblioteca da Cinemateca Capitólio.
Cartaz: “Mar Inquieto”
(2016, ficção, 98 minutos), de Fernando Mantelli. Com Rita Guedes, Miguel Lunardi, Áurea Baptista, Marcos Contreras e Eri Johnson.
Sinopse:
Anita, uma ex-viciada em drogas, vive em uma praia, com uma rotina sem propósito e amedrontada pelos próprios fantasmas. Enclausurada nesse local sombrio, o que ela mais teme está dentro de sua casa: o instável marido Vitorino.
Autor do cartaz: Janice Alves
Técnica: Fotografia
Créditos da imagem: Acervo Produtora Guedes Filmes
Primeiro longa do diretor Fernando Mantelli, produzido pela atriz paulista Rita Guedes, também sua protagonista. O filme, um drama de suspense psicológico ambientado no litoral do Rio Grande do Sul, confirma a predileção do diretor pelo cinema de gênero, pouco praticado no Estado, e já manifestada nos seus curtas desde a década de 90, em títulos como “Blecaute” (1990), que marcou sua estreia na bitola 35mm.
O cinema gaúcho em 1980
Antes de interromper a sua programação em função da pandemia do novo coronavírus, em meados de março, a Cinemateca Capitólio havia iniciado uma mostra de filmes lançados no ano de 1980. Entre os vários títulos programados, não havia nenhuma produção gaúcha, contrariando uma das diretrizes de programação do espaço: incluir em suas mostras temáticas, sempre que possível, filmes realizados no Estado.
A ausência justifica-se em parte pelas condições da produção cinematográfica local há 40 anos. Segundo os catálogos “Cinema Gaúcho – Anos 80” (1985) e “Cinema Gaúcho Anos 80 – Um Olhar Sobre a Década” (1991), ao longo de 1980 foram lançados apenas seis títulos, todos de curta duração: “Ave Soja, Santa Soja”, de Rubens Bender; “Bonito, Bonito Mesmo É…”, de Antônio Oliveira; “Graf Zeppelin”, de Antônio Jesus Pfeil; “Um Maravilhoso Espanto de Viver”, de Antônio Carlos Textor; “Sexo & Beethoven”, de Carlos Gerbase, e “Contos Neuróticos”, de Tuio Becker. À exceção dos curtas de Gerbase e Becker, ficções rodadas em Super-8, todos os outros títulos são documentários em 35mm. Em seus curtas, Antônio Carlos Textor e Antônio Oliveira se debruçam sobre a obra do escritor Mário Quintana e do músico Túlio Piva, respectivamente. Já Antônio Jesus Pfeil resgata raras imagens da passagem do dirigível Graf Zeppelin por Porto Alegre na década de 30. Em “Ave Soja, Santa Soja”, Rubens Bender faz uma dura crítica ao crescimento predatório da monocultura da soja no Estado e suas consequências econômicas e sociais (o filme conquistaria o prêmio de melhor curta gaúcho no 8º Festival de Gramado). Em suas incursões na ficção, Carlos Gerbase adapta um conto do escritor Rubem Fonseca, e Tuio Becker apresenta episódios que ilustram expressões idiomáticas de teor sexual, como “armar a barraca”, “levar ferro” e “molhar o biscoito”, entre outras.
É importante observar que em 1980 ainda não existia a APTC (fundada em 1985), tampouco o IECINE (criado em 1986) ou a Coordenação de Cinema, Video e Fotografia da Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre (criada somente em 1991), a explosão da geração Super-8 estava em gestação e a produção de longas na bitola profissional só ocorreria em 1984, com a estreia de “Verdes Anos”, de Carlos Gerbase e Giba Assis Brasil. Muito se conquistou desde então, como sabemos. Por isso mesmo, é preciso valorizar e dar visibilidade aos esforços quase solitários desses seis diretores, que há exatos 40 anos começavam a abrir novos caminhos para a profissionalização da atividade cinematográfica no Rio Grande do Sul.
* Na foto, imagem de “Sexo & Beethoven”, de Carlos Gerbase.
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